22 de abril 2024 às 10H10
O advogado pontuou que a insistência da AGU em reabrir os processos com títulos transitados em julgado “contraria o definido pelo STJ, que determinou a obediência à coisa julgada no mesmo repetitivo 613 que gerou o tema 826”, razão por que “a AGU deveria considerar reduzir os litígios ou mesmo realizar acordos nesses casos transitados em julgado para diminuir a conta para o futuro”. Isso, porque “a prática demonstra que as novas perícias realizadas em liquidação chegam em valores superiores aos das perícias originais” e “os valores tendem a aumentar em razão da incidência de juros e correção monetária, que beiram hoje 70% das indenizações”.
Szelbracikowski afirmou à repórter que, “além do repetitivo, há acórdãos das duas turmas do STF assentando a impossibilidade de mudar o disposto na coisa julgada e a inaplicabilidade do tema 826” e que, recentemente, a União foi multada pela Corte Especial do STJ por apresentar recurso protelatório em processo com trânsito em julgado (AREsp 2126171/DF, DJe 12/04/24).
Em relação aos processos que ainda não passaram em julgado, o advogado explicou que “a obtenção da indenização supõe a realização da prova do efetivo prejuízo econômico e (…) alguns processos já tiveram perícias com esse novo critério”.
VALOR ECONÔMICO – 22/04/2024
Por Guilherme Pimenta e Beatriz Olivon
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2024/04/22/governo-corre-para-desarmar-bomba-fiscal-de-ate-r-120-bi-com-precatorios.ghtml
Equipe jurídica vê potencial de perda em ação contra prejuízos do setor sucroalcooleiro na década de 1980 decorrentes de intervenções do poder público.
A equipe jurídica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai montar uma força-tarefa para desarmar uma “bomba-fiscal” que pode resultar em precatórios contra a União entre R$ 80 bilhões e R$ 120 bilhões, o que preocupa as secretarias do Tesouro e do Orçamento, segundo apurou o Valor. Com a recente vitória no Supremo Tribunal Federal (STF) no caso da área previdenciária conhecido como “revisão da vida toda”, a nova prioridade do governo são as ações bilionárias envolvendo o setor sucroalcooleiro, nas quais a União já prevê uma “perda provável” dos processos no Judiciário, mas quer mitigar os impactos.
O tema hoje é o mais relevante para o governo no Judiciário e passou a ser acompanhado com lupa nas últimas semanas pela Advocacia-Geral da União (AGU). A ideia é separar um grupo de até dez advogados que ficarão exclusivamente focados neste tema, listado no anexo de riscos fiscais da União na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) com impacto de R$ 79,6 bilhões às contas públicas.
Além de evitar essa perda, a AGU quer cancelar um precatório já emitido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) de R$ 14 bilhões para “devolver” esse valor para o Tesouro neste ano, o que pode auxiliar a União na busca da meta de déficit zero.
O pano de fundo da disputa são os prejuízos sofridos pelas usinas com a intervenção do governo nos preços da cana-de-açúcar, do açúcar e do álcool nos anos 1980. Em processos ajuizados uma década depois, usinas e destilarias alegaram que os preços fixados pelo governo à época, por meio do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), não cobriram os custos médios apurados pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Assim, portanto, essas empresas teriam sofrido grandes prejuízos.
Hoje, as ações transitadas em julgado contra a União totalizam R$ 79,6 bilhões, se considerar o valor das perícias realizadas nas fases de mérito, sem apuração de eventual dano efetivo, mas a conta pode chegar a até R$ 120 bilhões. O governo alega que os precatórios não podem ser expedidos, já que se faz necessária a liquidação para avaliar se houve, de fato, prejuízo, conforme entenderam os tribunais superiores.
De um lado, a AGU quer montar a força-tarefa para enfrentar as maiores bancas de advocacia do país, que defendem as empresas em mais de 300 processos por todo o território nacional – a maioria está concentrada no TRF-1. Mesmo em casos já transitados em julgado que estão em fase de execução, a União vai entrar com as chamadas rescisórias para tentar reverter o prejuízo.
“A usina tem que provar que teve prejuízo, não que lucrou menos do que esperava lucrar” — Flávio Tenório
Judicialmente, as usinas venceram a disputa em 2013, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que as medidas causaram prejuízos. As correções foram limitadas até 1991, quando o sistema de preços foi alterado. O STJ, porém, exigiu a comprovação de danos sofridos, por meio de balanços contábeis, o que abriu um novo campo de batalha.
As usinas alegam que não têm como comprovar e ter todos os documentos desde aquela época, já que são mais de 30 anos de discussão na Justiça. Em 2020, o Supremo Tribunal Federal confirmou a decisão, determinando que as usinas comprovem o tamanho do rombo, o que deu sobrevida à União.
O governo alega que, ainda assim, algumas decisões de Tribunais Regionais Federais têm ignorado esse entendimento do STF e determinado o pagamento de precatórios com base em perícias genéricas. “As teses da União foram, em grande parte, acolhidas pelo STJ e pelo STF e ainda assim temos dificuldade em emplacar essas teses na execução”, afirmou Alexandre Dantas, advogado da União que acompanha esses processos no TRF-1 – as ações na corte processos somam mais de R$ 20 bilhões. A sensação, segundo ele, é de ter ganhado, mas não conseguir muitas vezes efetivar as teses.
“A União quer que, antes de executar, seja feita uma nova perícia para apurar o verdadeiro valor devido. Estamos falando de valores astronômicos. É necessário verificar o prejuízo real para não haver enriquecimento sem causa de alguma usina”, afirmou.
O procurador-regional da União na 1ª Região, Flávio Tenório, afirma que as perícias realizadas na fase de conhecimento não apuram o efetivo prejuízo de cada usina, no máximo redução dos lucros, o que seria inerente a uma política de intervenção na economia, como decidido pelo Supremo. “Para fim de indenização, o dano não é mera redução de lucros. A usina tem que provar que teve prejuízo, não que lucrou menos do que esperava lucrar”, defendeu.
Ele destaca que existem realidades diferentes para cada fase processual. Na fase de conhecimento (quando é discutido o mérito), o panorama no TRF-1 é favorável à União, considerando que a decisão do STF é de que o dano indenizável seria só o prejuízo efetivo, apurado por meio de perícia e que representa o que a usina perdeu de fato, não o que deixou de lucrar.
Na fase de execução, quando é analisado o valor a ser pago, muitas decisões determinam a liquidação para apuração do valor, mas as perícias não são feitas. “A União não tem problema em pagar os valores efetivamente devidos. Mas precisamos descobrir quais valores são esses”, afirmou.
Nesse contexto, a ex-ministra do STF Rosa Weber concedeu uma medida cautelar em setembro de 2023 cancelando a emissão de precatório de R$ 5 bilhões que teria sido expedido de forma irregular pelo TRF-1, já que não houve trânsito em julgado da ação.
No TRF-1, 90% dos casos estão na fase de execução, e não de conhecimento, o que torna o cenário em Brasília mais complexo, segundo Alessandra Lopes, advogada da União que acompanha o tema no STF. Nos casos que ainda estão tramitando no Supremo, a discussão também é sobre a realização da perícia na fase de execução. “Nessa fase a gente precisa liquidar e saber quanto é [o valor exato]”, afirmou.
Em junho, o STF retomará um julgamento no qual será definido se a perícia deve ser feita só na fase de mérito ou na de execução. Caso a corte entenda que deve se limitar à primeira fase, será uma derrota para a União – o ministro Edson Fachin já votou nesse sentido. O julgamento foi interrompido por pedido de vista de Gilmar Mendes.
Daniel Corrêa Szelbracikowski, sócio do Dias de Souza, escritório que atua em muitas ações sobre o tema, avalia que a litigiosidade deveria diminuir com os precedentes, mas acabou aumentando porque a União não desiste das teses. “E as usinas estão tentando fazer novas perícias, segundo os novos critérios”, afirmou, indicando que, quando são usadas as perícias antigas, os pedidos acabam sendo negados já que elas não atendem os critérios fixados em decisões recentes dos tribunais superiores.
Já nas ações que já transitaram em julgado (não cabe recurso e estão em fase de execução), o advogado defende que o governo deve liquidar as ações decididas ainda segundo o critério antigo, antes das decisões superiores.
Ainda segundo o advogado, como a União continua litigando mesmo nesses casos transitados em julgado, os valores tendem a aumentar em razão da incidência de juros e correção monetária, que beiram hoje 70% das indenizações. “A AGU deveria considerar reduzir os litígios ou mesmo realizar acordos nesses casos transitados em julgado para diminuir a conta para o futuro”, afirma.
Procurado, o TRF1 não se manifestou.
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