11 de março 2014 às 10H50
Está em discussão no Congresso Nacional o regime criado pela Medida Provisória (MP) n 627 de tributação dos lucros auferidos no exterior por sociedades controladas ou coligadas a empresas brasileiras, sob a justificativa de “contribuir para a estratégia de internacionalização perseguida por empresas de capital nacional”.
A internacionalização de grupos econômicos é benéfica. Países como Alemanha, Reino Unido, França, Japão e Canadá, seguindo o modelo da OCDE, não tributam lucros de controladas operacionais de empresas sediadas em seus territórios. Outros, como EUA e China, diferem a tributação de lucros de atividades produtivas, inclusive quando reinvestidos – Nota Técnica “Impactos Econômicos do Modelo de Tributação do Lucro Auferido no Exterior por Subsidiárias de Empresas Brasileira”, de autoria da LCA Consultores.
Com isso, os que se sujeitam à carga tributária do local dos investimentos podem competir em condições de igualdade com empresas locais. Se a renda do exterior for tributada na sede da investidora, haverá aumento de custos e redução de investimentos. O espaço da investida seria ocupado por concorrentes locais ou de países que não tributam lucros operacionais auferidos no exterior.
O sistema da MP 627 é único. Não segue o modelo de tributação no destino, nem adota a desoneração do capital produtivo.
Deixar de tributar investimentos produtivos não impede o combate a práticas tendentes a burlar a tributação no país de origem. É por essa razão que se admite tributar nas investidoras os lucros mantidos em jurisdições não transparentes, bem como as rendas passivas, que não provêm da atividade produtiva (CFC rules).
O sistema da MP 627 é único. Não segue o modelo de tributação no destino (OCDE), nem adota os modelos norte-americano e chinês, que desoneram o capital produtivo.
A MP tributa todos os rendimentos auferidos no exterior, fundada na presunção de distribuição automática de lucros. Embora admita o crédito do tributo pago no exterior, a renda passiva e os ganhos em país sem acordo para a troca de informações ou com alíquota inferior a 20% são tributados de forma isolada e imediata. Já a renda ativa, com tributação igual ou superior a 20% no destino, se sujeita, no Brasil, ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), cujo pagamento é financiado em cinco anos, com atualização cambial e juros Libor.
Se o modelo da MP 627 for aprovado, as empresas brasileiras perderão competitividade. Imagine-se uma controlada que participe de concorrência internacional para a execução de obra pública e, como as demais interessadas, tenha um benefício fiscal. Se a investidora brasileira tiver de tributar os resultados da controlada, ficará em situação competitiva inferior às empresas sujeitas unicamente à tributação no destino.
Para afastar tais inconvenientes, a MP 627 deve ser alterada. As rendas de investimentos produtivos devem ser tributadas exclusivamente no país da investida. Se isso não for possível, deve-se, no mínimo, assegurar a compensação do imposto pago no exterior, a consolidação integral dos resultados lá obtidos e a intributabilidade dos reinvestimentos produtivos. Além disso, é fundamental que sejam respeitados os tratados destinados a evitar a bitributação.
Isso não significa abrir mão de tributar empresas com rendas passivas relevantes localizadas em países sem controles adequados. A impossibilidade de fiscalização justifica a presunção de que os ganhos estariam à disposição da investidora e, por isso, seriam passíveis de tributação automática.
O modelo sugerido alinha-se com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 2.588/DF, no sentido de que a presunção de disponibilização de lucros seria admissível para combater a elisão e a evasão fiscal. Tal presunção só seria razoável quando inviável fiscalizar as empresas investidas. É verdade que há pontos a serem definidos pelo STF. Entretanto, a jurisprudência existente permite concluir que uma lei que estabeleça critérios adequados para o controle de operações abusivas deva ser considerada constitucional.
O mesmo não se pode afirmar de lei que tribute indistintamente rendimentos auferidos por investidas de empresas brasileiras, como propõe a MP 627.
Por essas razões, é conveniente seja alterada a MP 627 de sorte que o combate a procedimentos fiscais abusivos não interfira com a competitividade das multinacionais brasileiras. Devem-se distinguir as situações em que haja real atividade econômica no exterior daquelas em que sejam constituídas empresas em países sem controles adequados, com a única finalidade de evitar a tributação no Brasil.
Hamilton Dias de Souza é sócio fundador do escritório Dias de Souza Advogados Associados
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