20 de agosto 2016 às 13H34
INTRODUÇÃO
O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015)- CPC/2015, em vigor desde março de 2016, influenciará decisivamente diversas questões relacionadas ao direito tributário.
Cite-se, exemplificativamente, a dinamização da prova e o seu reflexo nos em bargos à execução fiscal; as tutelas de urgência e de evidência nas ações tributárias; a remessa necessária que deixa de existir relativamente às questões já apreciadas sob a sistemática repetitiva; o incidente de desconsideração da personalidade jurídica que suscita debates sobre a sua aplicabilidade em relação aos ilícitos previstos nos arts. 124, I, e 135 do CTN, e ao redirecionamento da dívida para empresa de um mesmo grupo econômico; a questão dos honorários advocatícios que, em regra, passarão a incidir sobre o proveito econômico da ação, o que possibilitará a justa remuneração das partes, mas também aumentará o risco das demandas em função dos valores discutidos, entre outras.
Além dessas questões, o Código em vigor pretende, sobretudo, contribuir para a formação de um subsistema de precedentes com uma cultura de racionalidade e celeridade nos julgamentos. Isso se verifica com a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas – IRDR e o fortalecimento da tutela pluri-individual[2]. Trata-se de temática que atinge grande parte das causas tributárias por relacionar-se à proteção dos direitos individuais homogêneos[3] . No âmbito dessa nova cultura imaginada pelo CPC/2015, andam juntos os princípios da celeridade na prestação jurisdicional e da segurança jurídica.
É sob o prisma da segurança jurídica e da proporcionalidade que o presente trabalho analisará duas normas previstas no Código em vigor. A primeira, constante dos§§ 5º e 12 dos arts. 525 e 535, respectivamente, possibilita que o executado alegue a inexequibilidade de título judicial formado em desacordo com a orientação jurisprudencial do STF. Neste tópico, serão verificadas as principais modificações realizadas em relação à norma existente no código anterior – art. 741 do CPC/1973 – e será comentada a decisão proferida pelo STF na AD ln 2.41 B no bojo da qual foi analisada a constitucionalidade do referido dispositivo. A segunda norma objeto de exame é a prevista nos§§ 8º e 15 dos arts. 525 e 535, respectivamente. Esses dispositivos estabeleceram nova hipótese de ação rescisória, contada não a partir do trânsito em julgado do título judicial, mas do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF que tenha declarado inconstitucional a norma que fundamenta o título executivo judicial ou a ela atribuído interpretação divergente da encampada pelo mencionado título. Será objeto de exame a constitucionalidade desse novo termo a quo estabelecido para a rescisória especial prevista no CPC/2015.
Por fim, o trabalho analisará os efeitos da coisa julgada nas relações tributárias de trato continuado à luz do CPC/201.5 e do. Parecer PGFN/CRJ nº 492/2011. Serão criticadas as posturas argumentativas que ignoram o processo de constituição e desconstituição da norma individual e concreta estabelecedora da relação jurídico-tributária e a distinção existente entre os processos de construção e interpretação do direito nos sistemas de civil law e de precedentes.
1 A ALEGAÇÃO DE INEXEQUIBILIDADE DE TÍTULO JUDICIAL FORMADO EM SENTIDO DIVERSO DO CONSIDERADO PELO STF E AS MODIFICAÇÕES HAVIDAS EM RELAÇAO AO CPC/1973
O Código de Processo Civil de 2015 manteve a regra que possibilita a arguição de inexequibilidade de título judicial quando este se funda em norma declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal ou em interpretação tida por aquele Tribunal como incompatível com a Constituição em sede de embargos à execução ou de impugnação ao cumprimento de sentença.
No Código de Processo de 1973, a referida regra estava disposta no parágrafo único do art. 741 (e no art. 475-L, § 1º) nos seguintes termos:
Art. 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os embargos só poderão versar sobre:
II – inexigibilidade do título;
Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.
O Código atual tratou da questão nos §§ 5º e 12, respectivamente, dos arts. 525 e 535, verbis:
Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.
§ 1 º Na impugnação, o executado poderá alegar:
[. .. ]
III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
§ 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1 º deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:
[. .. ]
III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federar, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
Primeiramente, cumpre observar que a dicção das referidas normas aponta para que a alegação de inexigibilidade deva ser feita exclusivamente na petição dos embargos ou da impugnação ao cumprimento de sentença.
Não realizada nesses específicos momentos processuais, a alegação de
inexequibilidade não poderá ser feita posteriormente em função da preclusão[4]. Assim, não suscitada a inexequebilidade do título na impugnação ou nos embargos à execução, o executado não poderá fazê-lo posteriormente quando, por exemplo, apenas houver controvérsia acerca dos cálculos exequendos.
Outrossim, o CPC/2015 adicionou ao texto legal a hipótese em que o STF declara a inconstitucionalidade de lei ou atribui a incompatibilidade de determinada interpretação com a Constituição em controle difuso de constitucionalidade, o que não estava previsto no Código anterior. Ampliou, portanto, as situações em que podem ser utilizados os precedentes do Supremo como matéria de defesa nos embargos à execução, o que tem reflexos diretos no direito tributário.
Como se sabe, grande parte das repercussões gerais julgadas e reconhecidas aborda temas relacionados a direito tributário[5]. No contexto do Código anterior, era controvertida a utilização dos precedentes decorrentes do controle constitucional na modalidade difusa como matéria de defesa, em função da consideração de que apenas os julgados proferidos no controle concentrado e abstrato de constitucionalidade serviriam de fundamento para a referida arguição.
Com o Código de 2015, não há mais dúvida a esse respeito. Nesse ponto, a legislação acompanhou o entendimento, cada vez mais consolidado pela jurisdição constitucional, de que há um processo de maior objetivação do controle difuso e concreto de constitucionalidade, principalmente em função dos institutos a repercussão geral e da súmula vinculante[6].
Cumpre consignar que sempre houve dúvida a respeito da constitucionalidade desses dispositivos que preveem a oposição de inexequibilidade de título judicial transitado em julgado em oposição a entendimento firmado pelo Supremo[7].
O Supremo Tribunal Federal iniciou a apreciação dessa temática na ADln 2 418[8]. O julgamento ocorreu em 4 de maio de 2016, quando já estava em vigor o Código de Processo Civil de 2015 e, portanto, revogada a legislaçao anterior. A desperto disso, o STF não julgou a ação direta prejudicada, pois entendeu que “a matéria nele (art 741 parágrafo único, do CPC/1973) disciplinada recebeu tratamento normativo semelhante, embora não igual, nos §§ 5º a 8º do art · 535 e nos§§ 12 a T 5 do art. 525 do novo CPC”.
De acordo com o Supremo, “as previsões do CPC/2015 cuidaram apenas de ‘adjetivar’ o instituto de inexigibilidade por atentado às decisões deste Supremo Tribunal Federal, mas não lhe comprometeram naquilo que ele tem de mais substancial, que é a capacidade de interferir na coercitividade de títulos judiciais”.
Assim, admitido o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade, o Supremo declarou a constitucionalidade do dispositivo, mas determinou a sua aplicação apenas aos casos em que as sentenças individuais foram proferidas anteriormente à decisão exarada pelo STF, seguindo a lógica subjacente ao CPC/2015.
Apesar do já decidido pelo Supremo, dúvidas ainda remanescem a respeito de algumas situações tuteladas pelo antigo parágrafo único do art. 7 41 do CPC/1973 que podem ser esclarecidas pelo STF quando do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 611.503/RG.
De fato, imagine-se a situação em que uma parte obtém êxito em processo judicial em data contemporânea ao julgamento do STF que aprecia a mesma matéria de forma diametralmente oposta à verificada em seu caso. Por estar ciente dessa disparidade de entendimentos, e também sabendo que a legislação processual em regra garante o prazo de cinco anos para a execução de título judicial transitado em julgado, o vencedor da ação prudentemente resolve aguardar o prazo de dois anos de eventual ação rescisória para só então executar o julgado. A parte sucumbente não ingressa com a ação rescisória nesse prazo. Diante disso, o vencedor da demanda resolve executar o título. Neste momento, passados mais de dois anos do trânsito em julgado da sentença, o executado opõe embargos à execução, sob o fundamento de inexequibilidade do título. Numa hipótese como essa, se fosse admissível a aplicação do art. 741, § 1º, do CPC/1973, o exequente que tomou todas as cautelas possíveis antes de ingressar com a execução não apenas veria a redução a pó de uma sentença transitada em julgado e não rescindida ordinariamente, como também arcaria com a sucumbência decorrente de sua derrota nos embargos à execução.
Para situações com a acima narrada, parece-nos que o parágrafo único do art. 741 do CPC/1973 deveria ser interpretado em conformidade com a Constituição para que também não fosse aplicável às sentenças judiciais já transitadas em julgado contra as quais não houvesse mais a possibilidade de ajuizamento de ação rescisória por decurso do prazo, independentemente se a decisão do STF tivesse sido anterior ou posterior à formação do título.
Ou seja, o referido dispositivo não poderia ser aplicado àqueles casos em que transcorreu in a/bis o prazo de dois anos para o ajuizamento da ação de desconstituição da coisa julgada.
Nesse contexto, ao revés de preservar o sistema jurídico, a utilização desses dispositivos como matéria de defesa contribuiria para a criação de um ambiente de insegurança jurídica. Surgiria como uma nova hipótese de rescisão do julgado, porém sem estar contida no antigo rol do art. 485 do CPC/1973 ou precisar observar o prazo de dois anos, o que não parece razoável.
Ressalvada a crítica acima quanto à necessidade de, em qualquer hipótese observar- se o prazo de dois anos do trânsito em julgado para a arguição de inexigibilidade prevista no parágrafo único do art. 741 do CPC/1973, em geral a interpretação realizada pelo Supremo foi ao encontro do que está disposto no Código em vigor. De fato, o novo Codex possui normas específicas nos §§ 14 e 7, dos arts. 525 e 535, respectivamente, segundo as quais a decisão do Supremo Tribunal Federal que fundamente eventual arguição de inexequibilidade do título”
[ … ] deve ser anterior ao trânsito em julgado a decisão exequenda”.
2 A INCONSTITUCIONAL AÇÃO RESCISÓRIA CUJO PRAZO INICIA A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E NAO DA SENTENÇA RESCINDENDA
Em acréscimo à hipótese tratada no item anterior, o Código de Processo Civil de 2015 inaugurou na ordem jurídica a poss1bil1dade de manejo de nova espécie de ação rescisória contada do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Essa ação rescisória “especial”, localizada no capítulo atinente ao cumprimento de sentença, foi prevista para a situação em que a decisão proferida pelo STF seja posterior ao transito em julgado do título exequendo, conforme se verifica da leitura dos §§ 8º e 15 dos arts. 525 e 535, respectivamente:
Art. 525. [ … ]
§ 15. Se a decisão referida no§ 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
Art. 535. [ … ]
§ 8º Se a decisão referida no§ 5º for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
É, no entanto, duvidosa a constitucional idade dessas normas, conforme a seguir se verá.
Primeiro, porque esses dispositivos não estabelecem o prazo para o manejo da rescisória, acarretando, para além de enorme insegurança JUríd1ca, a incompletude da norma e sua ineficácia técnica[9].
Segundo, porque, mesmo que se adotasse o prazo geral de dois anos previsto para o ajuizamento das rescisórias “comuns”, o dispositivo padeceria de inconstitucionalidade por elastecer irrazoavelmente o tempo para a desconstituição de sentenças transitadas em julgado, afrontando, com isso, a segurança jurídica e o princípio da proporcionalidade. Isso porque o termo a quo da contagem do prazo – a data da decisão do STF – ficaria indefinido, dissociado e independente da data do trânsito em julgado dos casos concretos, podendo ocorrer muitos anos depois da formação da coisa julgada.
Tome-se como exemplo a situação em que um contribuinte obtém uma sentença, em 2005, assegurando-lhe a repetição do indébito em função do recolhimento a maior de PIS/Cofins em função da inclusão do ICMS na base de cálculo das referidas contribuições sociais. Considere-se que a decisão tenha transitado em julgado em 2006 e que o prazo para o manejo de rescisória tenha finalizado em 2008 sem a oposição da referida ação. Imagine-se que o contribuinte tenha dado início ao cumprimento da sentença em 2010, dentro do prazo prescricional de cinco anos para tanto, e tenha requerido a realização de perícia contábil para identificar o montante a ser repetido. Considere-se que a perícia tenha finalizado apenas em 2016, estando as partes discutindo apenas o acerto dos cálculos obtidos pelo vistor oficial. Agora, imagine-se que o STF venha, em 2017, a apreciar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 18[10], assentando-se a constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
Nessa hipótese, admitir que a Fazenda Pública pudesse ajuizar a ação rescisória mais de dez anos depois do trânsito em julgado, até o ano de 2019 (dois anos a partir do pronunciamento do STF), mesmo não tendo manejado o referido instrumento processual entre 2005 e 2007, estaria de acordo com o princípio da segurança jurídica?
Parece-nos que não. A autoridade da coisa julgada material[11] é garantida constitucionalmente em alinho ao princípio da segurança jurídica exatamente para estabilizar as relações jurídicas e sociais (art. 5º, caput, XXXVI, da CF). Por isso, a eficácia preclusiva da
coisa julgada é, via de regra, intangível e imutável. Sua desconstituição realiza-se excepcionalmente por meio de ação rescisória, cujo cabimento depende da existência de algum dos vícios constantes da legislação e de um prazo razoavelmente previsto. Trata-se de exceção que visa a garantir a supremacia da constituição, o devido processo legal nas hipóteses expressa e legalmente previstas, tendo por limite a Constituição.
Veja-se que, ao declarar a inconstitucionalidade de urna norma, o STF trata de sua adequação à Constituição no plano da eficácia normativa. Porém, isso não significa que a referida norma não tenha gerado efeitos individuais e concretos no plano do ato singular, tal como na hipótese de uma sentença transitada em julgado havê-la considerado válida em sua fundamentação e não ter sido objeto de ação rescisória no prazo de dois anos da formação da coisa julgada.
Nessa hipótese, seria de rigor a preservação dessa norma individual e concreta em atenção à coisa julgada, ao devido processo legal e à proporcionalidade, corolários da segurança jurídica que deve nortear o Estado Democrático de Direito (arts. 1º e 5º, XXXVI e LIV, da Constituição). De fato, “os postulados da segurança jurídica e da proteção da confiança, enquanto expressões do Estado Democrático de Direito, mostram-se impregnados de elevado conteúdo ético, social e jurídico”[12].
Essa proposição coaduna-se com o recente entendimento do próprio Supremo, segundo o qual a decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das sentenças anter”1ores que tenham adotado entendimento diferente; para que tal ocorra, será indispensável a interposição do recurso próprio ou, se for o caso, a propositura da ação rescisória própria, nos termos do art. 485, V, do CPC, observado o respectivo prazo decadencial {CPC, art. 495)[13].
Portanto, para o STF, a modificação dessas sentenças somente poderia ser obtida mediante a interposição de recurso, na hipótese de ainda estar em curso a ação de conhecimento, ou o ajuizamento da competente ação rescisória, respeitados os prazos processuais previstos.
Essa mesma premissa deveria ser considerada para declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos em tela (ou atribuir-lhes interpretação conforme à Constituição, fixando-se, para todas as hipóteses, a data do trânsito em julgado com o termo a quo para a contagem do prazo), de modo a preservar as sentenças transitadas em julgado há mais de dois anos.
O que se propõe encontra justificativa na segurança jurídica em matéria tributária, assim conceituada por Mário Luis Oliveira da Costa:
Segurança jurídica é princípio, garantia individual e direito fundamental inerente ao Estado Democrático de Direito. Em matéria tributária, assegura não possa ser o contribuinte prejudicado, surpreendido ou frustrado em sua legítima confiança nas diretrizes fixadas pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Assegura, assim, tenha o contribuinte previsibilidade e certeza suficientes a lhe permitir planejar e organizar sua vida e suas atividades conforme regras claras, de que decorra a necessária estabilidade das relações jurídicas constituídas e o respeito às justas expectativas de direito delas decorrentes. Não pode ser comprometida ou contrariada a capacidade do contribuinte de boa-fé conhecer seus direitos e deveres, ou seja, de saber de antemão as consequências dos atos jurídicos que praticar. (Segurança jurídica em matéria tributária -41º Simpósio Nacional de Direito Tributário)
É importante assentar que a segurança jurídica desdobra-se na necessária proteção à confiança do contribuinte (arts. 5º, caput, e 37 da CF/1988), conceito “expresso na exigência de leis claras e densas e o princípio da confiança, traduzido na exigência de leis tendencialmente estáveis ou, pelo menos, não lesivas da previsibilidade e calculabilidade dos cidadãos relativamente aos seus efeitos”[14].
Tão relevante é a manutenção da segurança jurídica no sistema jurídico que o STF vem entendendo que “razões de segurança jurídica podem obstar à revisão do ato praticado com base na lei declarada inconstitucional”[15]. Essa mesma ratio inspirou o CPC/2015, ao sugerir a modulação de efeitos na hipótese de modificação de jurisprudência por parte dos Tribunais Superiores, inclusive para fins de (não) aplicação dos§§ 15 e 5º dos arts. 525 e 535.
Em suma, a integridade e a força normativa[16] da Constituição implicam a necessária consideração de todos os seus princípios, entre os quais o da segurança jurídica, tão caro e necessário à preservação do Estado de Direito. Daí por que, na hipótese examinada, a alegação singela de supremacia da Constituição ou da interpretação última do Supremo não seria suficiente para justificar a constitucionalidade das normas em tela.
Ao contrário, a supremacia da Constituição parece revelar a necessidade de igual consideração ao princípio da segurança jurídica, o qual é pressuposto pela identidade constitucional[17] da Carta de 1988. De fato, ”quanto mais o conteúdo de uma Constituição lograr corresponder a natureza singular do presente, tanto mais seguro há de ser o desenvolvimento e sua força normativa”[18] .
Mas, para além da segurança jurídica, seria proporcional e razoável que o sistema jurídico permitisse a rescisão de uma sentença transitada em julgado há mais de dez anos, tal como no exemplo mencionado?
Também sob a ótica da proporcionalidade parece-nos que não.
É que a ação rescisória não deve ser admitida como se recurso fosse. Deve ser utilizada apenas e tão somente como uma “válvula de segurança, última via de correção para o sistema judicial [ … ], sujeita a prazo e hipóteses específicas, tendo em vista aquela perspectiva de resguardo da segurança jurídica” (STF, EDcl-RE 328.812-1/AM, Pleno, Rei. Min. Gilmar Mendes, J. 06.03.2008).
Não se desconhece o entendimento do STF, expressado exatamente quando do julgamento da ADln 2418, de que a coisa julgada’. apesar de ter origem na própria Constituição, deverá ter os seus contornos e limites estabelecidos pelo legislador ordinário”.
No entanto, naquele mesmo julgamento o Supremo assentou que os limites e requisitos estabelecidos (ou não) pelo legislador ordinário têm como limite os critérios de razoabilidade e proporcionalidade que decorrem diretamente de outros valores e princípios previstos pela Constituição:
A legitimidade da solução oferecida pelo legislador ordinário supõe observância de critérios de razoabilidade e de proporcionalidade, a fim de não comprometer mais do que o estritamente necessário qualquer dos valores ou princípios constitucionais colidentes.
Isso significa que as hipóteses de desconstituição da coisa julgada devem estar perfeita e claramente delineadas na legislação, especialmente o prazo para o manejo da ação rescisória.
Torná-la passível de ser utilizada sem um prazo definido – porque dependente sempre de um possível e futuro pronunciamento do STF, termo a quo para a contagem do prazo – não se coaduna com o princípio da proporcionalidade, pois não passa no teste de adequação entre meios e fins, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito da medida[20].
De fato, a existência de uma ação rescisória com prazo indefinido é inadequado e excessivo para tutelar o interesse público. Na realidade, o contraria na medida em que impossibilita a realização da paz social. Significa a manutenção, por longos anos, de uma “espada sobre a cabeça” do contribuinte que eventualmente já ganhou sua ação e viu o transcurso in a/bis do prazo para a rescisória “comum”, mas que ainda poderá ser surpreendido com a “descida da lâmina sobre o seu pescoço”, tudo a depender de um possível, eventual e futuro pronunciamento do STF sobre a matéria de fundo decidida em seu processo.
Ora, o Supremo Tribunal Federal já assentou que[… ] especialmente quando se tratar de matéria tributária, impõe-se, ao Estado, no processo de elaboração das leis, a observância do necessário coeficiente de razoabilidade, pois, como se sabe, todas as normas emanadas do Poder Público devem ajustar-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do substantive due process of law (CF, art. 5º, LlV), eis que, no tema em questão, o postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais [ … ][21].
Nesse sentido, aquele Tribunal tem evitado conceder aos jurisdicionados instrumentos que permitam a renovação contínua de questionamentos de lides já decididas em favor da pacificação das controvérsias instauradas no seio da sociedade. Com efeito, na apreciação da ADln 2418, o Supremo afastou o entendimento mais “permissivo” da doutrina em relação ao antigo art. 741, parágrafo único, do CPC/1973 quando assentou que
a admitir-se a ineficácia das sentenças em tão amplos domínios, restaria eliminado, de modo completo, pelo menos em matéria constitucional, o instituto da coisa julgada, que também tem assento na Constituição. Comprometer-se-ia também um dos escopos primordiais do processo, o da pacificação social mediante eliminação da controvérsia, pois ficaria aberta a oportunidade de permanente renovação do questionamento judicial de lides já decididas[22].
Esse entendimento faz parte de uma jurisprudência estabelecida há mais de cinquenta anos, segundo a qual, em favor mesmo da tranquilidade pública, da tranquilidade jurídica, em razão mesmo da eficácia da coisa julgada, terminou o julgamento, ainda que tomado por maioria ocasional. A questão não podia ter s·1do reaberta, em ação rescisória, como se se tratasse de um recurso de revista, que tem por escopo unificar a jurisprudência, porque a ação rescisória só cabe quando há manifesta e flagrante violação à lei[ … ][23].
Em suma, manter os §§ 8 e 15 dos arts. 525 e 535 do CPC/2015 no ordenamento jurídico implicaria admitir a quebra da estabilidade que o sistema jurídico exatamente visa a garantir a partir da estabilização contrafática das expectativas[24]. Com isso, seriam desconsiderados os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade, a não ser que se estabelecesse interpretação conforme à Constituição, no sentido de admitir o ajuizamento da ação rescisória desde que dentro do prazo de dois anos do trânsito em julgado do caso concreto em todas as hipóteses.
3 A COISA JULGADA DECORRENTE DE OBRIGAÇÕES CONTINUATIVAS. UMA ANÁLISE À LUZ DO CPC/2015
Outra grande questão pendente de apreciação pelo Judiciário refere-se ao impacto da coisa julgada nas relações de trato continuativo na seara tributária.
Em regra, a sentença tem eficácia retroativa sobre os fatos. Isso porque geralmente o juízo decisório se dá em relação às consequências jurídicas de fatos ocorridos no passado. Há, no entanto, situações em que as relações jurídicas submetidas à apreciação do Judiciário são permanentes ou repetem-se sucessivamente de forma homogênea. Esse é o caso de muitas das relações jurídicas tributárias em que há certa estabilidade no fenômeno da incidência, por exemplo, o das empresas que, enquanto ativas, estão constantemente submetidas ao imposto sobre a renda e às contribuições incidentes sobre o lucro, o faturamento, a folha de salários etc.
Essas relações jurídicas são identificadas como continuativas em oposição àquelas que ocorrem de forma instantânea[25-26]. Diante de suas características peculiares, interferem nas consequências da coisa julgada, a implicar sua relevância do ponto de vista jurídico. Mas a matéria não é apenas juridicamente relevante. Também o é sob o prisma econômico, [ … ] na medida em que determinada decisão altera ou confirma o status jurídico-tributário de determinado contribuinte estará, em um prisma conjuntural, dependendo do vulto econômico daquele contribuinte, alterando também toda a cadeia produtiva de um determinado setor[27].
Nessa esteira, em 2016, o STF reconheceu a repercussão geral do tema em dois leading cases distintos nos quais a discussão de fundo reside exatamente na eficácia de decisões transitadas em julgado que reconheceram o direito de determinado contribuinte não recolher a contribuição social sobre o lucro líquido – CSLL.
No RE 949297/CE, o Relator, Ministro Edson Fachin, estabeleceu que o tema jurídico controvertido é o limite da coisa julgada em âmbito tributário, na hipótese de o contribuinte ter em seu favor decisão judicial transitada em julgado que declare a inexistência de relação jurídico-tributária, ao fundamento de inconstitucionalidade incidental de tributo, por sua vez declarado constitucional, em momento posterior, na via do controle concentrado e abstrato de constitucionalidade exercido pelo STF[28].
A repercussão geral foi reconhecida pelo Plenário Virtual do Tribunal de modo a encampar o entendimento do Relator, no sentido de que a controvérsia seria juridicamente relevante para se definir os limites da coisa julgada na seara tributária em consonância com o princípio da segurança jurídica e também em função da necessidade de discussão acerca da vigência e aplicabilidade da Súmula nº 239/STF, segundo a qual “decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores”.
Além disso, o Supremo assentou a relevância econômica e social da matéria, em função não apenas do impacto que o tema pode causar sobre as finanças públicas da União, mas dos desvios concorrenciais tributários que a manutenção de sentenças desse jaez podem causar sobre o mercado e também das legítimas expectativas de previsibilidade dos atos jurisdicionais na sociedade[29].
O outro caso líder decorre do RE 955.227/BA, sob a relataria do Ministro Roberto Barroso, para quem o Supremo deve emitir “pronunciamento definitivo acerca dos limites temporais da coisa julgada, especialmente quando se analisam seus desdobramentos em situações que manifestam uma continuidade do tempo”[30]. Para o relator, o Supremo precisa estabelecer se a coisa julgada que declarou a inconstitucionalidade da Lei nº 7.869/19~8 impede, ou não, a futura cobrança do tributo, tendo em vista a posterior manifestação deste Supremo Tribunal Federal, em sede de controle difuso e concentrado, no sentido da constitucionalidade da norma, circunstância que pode denotar uma virada no suporte jurídico que fundamentara a decisão proferida pelo Tribunal de origem[31].
Semelhantemente ao definido no outro leading case, o Supremo entendeu presentes a relevância jurídica, econômica e social.
Neste caso, porém, identificou-se que o impacto econômico da decisão não atingiria apenas a Fazenda, mas também os contribuintes. Afinal, “sob o ponto de vista do contribuinte, o resultado definirá se ele deve voltar a pagar o tributo que não mais pagava por força de título judicial transitado em julgado, o que gera óbvios reflexos patrimoniais”[32].
Além disso, o segundo caso abordará também as situações em que o STF vem a definir posição contrária à transitada em julgado no controle difuso de constitucionalidade e não apenas na sistemática de controle concentrado e abstrato. Analisará, assim, três itens constantes do Parecer PGFN/CRJ nº 492/2011, nos seguintes termos:
Penso que está presente também o requisito da relevância social, porque a situação tem grande potencial de ser replicada em outros casos nos quais se discuta a constitucionalidade de uma relação jurídico-tributária, e que ocorra, ou já tenha ocorrido, decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a mesma matéria. Ademais, a Administração Tributária Federal, por meio do Parecer PGFN/CRJ nº 492/2011, ao qual foi conferido eficácia normativa pelo Ministro da Fazenda, assumiu como orientação a premissa lançada pelo recorrente. Com isso, considera que têm o condão de fazer cessar os efeitos prospectivos da coisa julgada em matéria tributária as seguintes decisões:
(i) as decisões do Plenário do Supremo Tribunal Federal, anteriores a 3 de maio de 2007 (data a regulamentação do instituto da repercussão geral), proferidas em controle difuso de constitucionalidade e reiteradas em julgados posteriores da Corte;
(ii) as decisões do Plenário do Supremo Tribunal Federal, posteriores a 3 de maio de 2007 (data a regulamentação do instituto da repercussão geral), desde que julgadas sob o regime de repercussão geral;
(iii) qualquer decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso, desde que seguida de Resolução do Senado Federal, nos termos do art. 52, X, da CF.
Essas diferenças entre os casos, sutis, porém significativas, é que levaram o Tribunal a reconhecer a repercussão geral do mesmo tema de fundo em dois processos distintos[33].
Considerando que as relações envolvidas possuem natureza continuativa, possivelmente o Supremo analisará a questão constitucional levando em consideração não apenas o disposto no Código de Processo Civil de 1973, mas também o que foi positivado no código de processo em vigor.
Segundo entendimento corrente, a coisa julgada material nas relações de trato continuado – sucessivo – apenas produz efeitos enquanto mantidos os fundamentos de fato e de direito que justificaram a pro/ação da sentença transitada em julgado.
Essa já era a posição prevalecente sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, cristalizado no sentido de que a eficácia da coisa julgada encontra limite na cláusula rebus sic stantibus[34]’.
O Supremo analisará exatamente a correção desse posicionamento. Há, no entanto, sutilezas decorrentes da nova ordem jurídica processual que devem ser mencionadas.
Ao contrário do disposto no art. 468 do Código de Processo de 1973, segundo o qual a coisa julgada abrangia apenas o dispositivo da sentença, para o código em vigor a sentença irradia efeitos em função da questão principal decidida. Além disso, o CPC/2015 estabelece que as questões prejudiciais decididas também transitam em julgado, desde que tenha havido contraditório a seu respeito no processo e o juiz seja competente para decidi-las, verbis:
Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.
§ 1 º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:
I – dessa resolução depender o julgamento do mérito;
II – a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
III – o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.
Essa alteração é importante para a coisa julgada decorrente de relações de trato continuativo. Isso porque, mesmo na hipótese de mudança na legislação ou nos precedentes eventualmente referidos no dispositivo sentenciai, se os fundamentos da sentença, considerados como “questão principal”, mantiverem-se íntegros ao longo do tempo, a coisa julgada prevalecerá. Por exemplo, se uma sentença tiver afirmado que a disposição “x” da lei “a” fere algum dispositivo da Constituição, se sobrevier nova lei “b”, alterando o texto da lei “a” e revogando-a, mas mantendo o mesmo sentido da norma jurídica “x”, parece-nos que, estando em vigor a mesma Constituição, a coisa julgada material permanecerá hígida nessa hipótese.
Com isso não se quer dizer que todos os motivos de determinada sentença transitarão em julgado, até porque o Código de 2015 manteve, no inciso I do art. 504, a dicção da legislação anterior de que não passarão em julgado “os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença”. O que se afirma é que integrarão a coisa julgada todos os fundamentos da sentença que tenham se tornado “questão principal”, em função da existência de prévio contraditório e de sua característica prejudicial à lide. Isso é importante para as relações tributárias de trato continuativo, pois a análise da “questão principal” decidida, e não meramente do dispositivo da sentença, possibilitará ao intérprete melhor identificar quando houver modificação efetiva nas circunstâncias de fato e de direito apta a atrair a aplicação da regra rebus sic stantibus.
Além disso, mesmo na hipótese de efetiva alteração da norma jurídica pela via legislativa ou pela via jurisprudencial, a eficácia vinculante da decisão transitada em julgado entre as partes não cessa automaticamente para frente, como alega o Parecer PFN[35].
É que a alteração da norma geral e abstrata (lei) ou da norma geral e concreta (precedente) não implica a desconstituição automática das normas individuais e concretas (sentenças transitadas em julgado) positivadas por linguagem apropriada e autoridade competente anteriormente em sentido contrário. Para que tal ocorra, é necessário que haja um novo processo de positivação normativa por linguagem e competência próprias.
Com efeito, para as partes que já têm contra ou a favor de si uma sentença transitada em julgado, eventuais (i) mudança de jurisprudência ou (ii) declaração de inconstitucionalidade de norma constituem meros eventos despidos de significação jurídica enquanto não vertidos em linguagem própria por meio de um processo humano de positivação normativa.
De fato, segundo Carvalho, “a percussão da norma pressupõe um relato em linguagem própria: é a linguagem do direito constituindo a realidade jurídica” [36].
Isso significa que a constituição de um fato jurídico depende da conduta humana que, mediante linguagem, relate o evento ocorrido no mundo dos fatos, estabelecendo-se então os efeitos jurídicos daí decorrentes, verbis:
Para que haja o fato jurídico e a relação entre sujeitos de direito que dele, fato, se irradia, necessária se faz também a existência de uma linguagem: linguagem que relate o evento acontecido no mundo da experiência e linguagem que relate o vínculo jurídico que se instala entre duas ou mais pessoas. E o corolário de admitirmos esses pressupostos é de suma gravidade, porquanto, se ocorrerem alterações na circunstância social, descritas no antecedente de regra jurídica como ensejadoras de efeitos de direito, mas que por qualquer razão não vierem a encontrar a forma própria de linguagem, não serão consideradas fatos jurídicos e, por conseguinte, não propagarão direitos e deveres correlatos[37].
Ou seja, enquanto o Judiciário não positivar a alteração que a nova norma geral e abstrata (lei) ou geral e concreta (precedente) produzirá em relação às normas individuais e concretas anteriores (sentenças transitadas em julgado), aquelas não poderão afetar estas.
Em suma, na medida em que não sobrevier nova decisão que ateste a modificação dos efeitos da coisa julgada (que pode ser verificada até mesmo por meio de querela nullitatis[38]), o comando transitado em julgado permanecerá hígido, não havendo a produção de efeitos automáticos conforme pretendido pela Procuradoria da Fazenda Nacional.
Além do acima exposto, cumpre ressaltar que a PFN pretende aplicar ao subsistema de precedentes preconizado pelo CPC/2015 as mesmas premissas de funcionamento de aplicação – subsunção – da lei, ignorando, porém, as diferenças substanciais entre os referidos regimes.
Como se sabe, no âmbito da civil law, trabalha-se com a ideia de subsunção do fato à lei, norma geral e abstrata. No sistema de precedentes, cuja origem remonta ao common law [39], não se trabalha com esse ideário, mas com técnicas específicas de verificação do contexto e dos fatos que permeiam os precedentes, de modo a realizar o distinguishing, transformation, overrruling, overrriding, etc.
Essas figuras estão presentes no CPC em vigor[40], o qual estabeleceu, no sistema brasileiro de civil law, um subsistema de precedentes, inédito até então.
Nesse sentido, destaque-se que a fixação de teses jurídicas pelos Tribunais, acompanhada de normas que atribuam a essas decisões uma especial eficácia (caráter vinculante), possibilita a concretização da segurança jurídica em busca da integridade da ordem jurídica[41]· Com isso, o jurisdicionado terá a previsibilidade de saber o destino de seu recurso, independentemente da posição individual- pessoal -do Juiz ou Tribunal da causa, sujeitos que estão aos pré-conceitos do intérprete. Na hipótese de não obediência ao já fixado pelos Tribunais, caberá reclamação. Por outro lado, a técnica de julgamento e os procedimentos de aplicação das teses repetitivas possibilitam, também, a concretização da razoável duração do processo e da efetividade da jurisdição, na medida em que impedem a subida, aos Tribunais, de recursos que tratem de tema já apreciado pelo Judiciário, bem como possibilitam, em diversas circunstâncias, uma marcha processual mais célere e eficaz em busca da satisfação do bem da vida[42].
O acima exposto demonstra que, a partir desse subsistema de precedentes, as técnicas de construção do direito também devem se diferenciar. Não podem mais se confundir com o esquema de aplicação da lei ao fato presente na cultura jurídica brasileira, sob pena de se identificar uma incompatibilidade entre a teoria e a prática[43].
Isso é particularmente importante para o direito tributário, pois as questões relativas às circunstâncias jurídicas (leis, orientações jurisprudenciais, interpretações administrativas a respeito de determinado assunto existentes na época da prolação da sentença) e láticas, como as datas (i) do fato gerador previsto em sentença transitada em julgado, (ii) do fato gerador constante do caso que gerou o precedente do STF, (iii) da sentença transitada em julgado e (iv) do precedente do STF, são imprescindíveis para definir e distinguir as hipóteses de aplicação da orientação jurisprudencial firmada pelo Supremo.
A comparação dessas circunstâncias fáticas e jurídicas possibilitará ao intérprete verificar se a decisão do STF incidirá retroativamente, prospectivamente e em que medida. A partir desses pressupostos, o julgador poderá concluir, por exemplo, pela (i) aplicação imediata do precedente do Supremo; (ii) impossibilidade de modificação da coisa julgada na linha da ratio da Súmula nº 343/STF, cuja validade foi reafirmada pelo STF, em 2014, inclusive para questões constitucionais já debatidas anteriormente por aquele Tribunal44; ou (ii) modulação dos efeitos da decisão, possibilitando-se aos contribuintes um prazo razoável para se adequar à nova real idade normativa (decorrente da lei ou da jurisprudência).
Essa última solução foi, aliás, a sugerida pela Procuradoria Geral da República – PGR em Parecer apresentado no leading case – RE 949.297. Para o Parquet, em homenagem à boa fé dos contribuintes que se escudaram em sentenças válidas e plenas de efeitos, é mister assegurar que esse julgado tenha efeitos exclusivamente prospectivos em período suficiente para o conhecimento dos contribuintes e o replanejamento dos negócios e operações tributáveis pela contribuição social em tela. (Parecer nº 138597/2016 – ASJCIV/SAJ/PGR, p. 29)
Ocorre que todos esses elementos de interpretação e aplicação de precedentes decorrentes da nova ordem processual – e seus respectivos efeitos – parecem ter sido ignorados no Parecer da PFN. É o que afirma Massud ao criticar o documento produzido pela Fazenda:
Parece claro, portanto, que o Parecer procurou apenas substituir e adequar o termo lei para, com isso, encampar o sistema de valorização dos precedentes. Contudo, unidade, coerência e completude continuam sendo tratados como postulados gerais que preenchem dedutivamente o sistema e, assim, ao sustentar a incidência automática do paradigma, operando efeito rescisória imediato sobre a coisa julgada (para fatos geradores futuros), sem a necessidade de qualquer providência jurisdicional adicional (ainda que administrativa), continuamos no mesmo dilema, envolvidos numa segurança jurídica abstrata, onde dispositivos do julgado são aplicados como lei, desconectados dos fatos e dos fundamentos jurídicos. [ … ] O Parecer PGFN nº 492/2011 parte da correta premissa de que os juízes não são meros aplicadores da lei, de modo que a sentença não é um ato de subsunção mecânica.
Contudo, ao final, o Parecer pretende que a mudança jurisprudencial seja aplicada mecanicamente pela própria administração fazendária, internalizando um ato administrativo
(lançamento, lato sensu) para dentro do sistema normativo próprio da atuação jurisdicional e, o que é pior, sem a observância do contraditório[45].
Em suma, os fundamentos trazidos pela PFN quanto aos efeitos automáticos – rescisórios – das decisões proferidas pelo STF parecem equivocados. Há, como visto, a necessidade de (i) utilização de linguagem prescritiva para que ocorra a desconstituição da norma individual e concreta anterior e (ii) identificação exata do contexto, fundamentos de fato e de direito em que se inserem tanto a norma individual e concreta (sentença) quanto a geral e concreta (precedente) para fins de utilização das técnicas decorrentes do subsistema de precedentes positivado pelo CPC/2015.
CONCLUSÃO
O exposto neste breve ensaio demonstra que o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu normas que interferem diretamente na coisa julgada com impactos sobre o direito tributário.
Em relação ao Código de T 973, a nova lei melhor esclareceu as hipóteses em que será possível alegar, em sede de impugnação ou embargos à execução, a inexequibilidade de título executivo formado em desacordo com a orientação proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Ainda há, no entanto, dúvida sobre a aplicação do antigo parágrafo único do art. 7 4 T do CPC/1973 aos casos em que o título exequendo seja posterior à decisão proferida pelo STF e a alegação de inexequibilidade tenha surgido apenas depois dos dois anos do prazo para o ajuizamento da ação rescisória. Considerando que essa situação não foi objeto de debate pelo STF quando do julgamento da ADln 2.418, a questão poderá ser esclarecida pelo STF quando do julgamento do RE 611 .503, pendente de apreciação sob a sistemática da repercussão geral.
Outrossim, o CPC/2015 criou nova hipótese de ação rescisória para o caso de o STF declarar a inconstitucionalidade de norma (ou definir que determinada interpretação é incompatível com a Constituição) posteriormente ao trânsito em julgado de título exequendo que tenha adotado fundamentação diversa. Essa ação rescisória “especial” será cabível não a partir do trânsito em julgado da sentença exequenda, mas do trânsito em julgado da decisão do Supremo. Por não prever o prazo para o manejo dessa nova espécie de ação rescisória, parece-nos que a norma em epígrafe padece de ineficácia técnica. Além disso, mesmo que se considerasse o prazo de dois anos previsto para a ação rescisória “ordinária”, os §§ 8º e 15 dos arts. 525 e 535 do CPC/2015 padeceriam de inconstitucionalidade.
Isso porque alongariam, de forma irrazoável e indefinida, o prazo para a desconstituição da coisa julgada com vulneração aos predicados da segurança jurídica e da proporcionalidade, os quais são essenciais para a manutenção da integridade e da força normativa da Constituição.
Por fim, demonstrou-se que o CPC/2015 estabeleceu sutis modificações em relação ao conteúdo da sentença que transita em julgado. A coisa julgada não mais será considerada a partir do pedido e do dispositivo da sentença, mas das questões principais debatidas e efetivamente decididas. Isso tem especial interesse e aplicação na seara tributária no que se refere à coisa julgada relacionada às relações jurídicas continuativas. Esta tem como limite a cláusula rebus sic stantibus, mas não pode ser considerada rescindida automaticamente, conforme sustenta a PFN no Parecer PGFN/CRJ nº 492/2011. De fato, a norma geral e concreta (precedente do STF) não tem o condão de automaticamente desconstituir a norma individual e concreta formada anteriormente (sentença transitada em julgado). Sua desconstituição dependerá sempre da expedição, por autoridade competente, de nova norma individual e concreta mediante a utilização de linguagem prescritiva. Em acréscimo, o novo subsistema de precedentes idealizado pelo CPC/2015 possui técnicas próprias de criação e aplicação do direito que não se confundem com o esquema de aplicação da lei ao fato próprio do civil law.
Por isso, é imprescindível a identificação exata do contexto, fundamentos de fato e de direito em que se inserem tanto a norma individual e concreta (sentença) quanto a geral e concreta (precedente) para que haja a declaração de cessação dos efeitos da coisa Julgada material.
[2] “Pode-se definir a tutela pluri-individual como a atividade estatal voltada à justa composição das lides concernentes a direitos individuais homogêneos que se multiplicam em diversas demandas judiciais nas quais haja controvérsia, preponderantemente, sobre as mesmas questões de direito, de modo a racionalizar e atribuir eficiência ao funcionamento do Poder Judiciário, por um lado, e, por outro, assegurar a Igualdade e a razoável duração do processo.” {Dantas, 2015:83)
[3] Caracterizados pelos sujeitos delimitados e determináveis e objeto divisível. O núcleo de homogeneidade deriva, pois, da origem comum dessas demandas.
[4] Segundo Chiovenda, “la preclusión es una institución general que tiene frecuentes aplicaciones en el proceso, y que consiste en la perdida de una facultad procesal por haberse llegado a los limites fijados por la fey para el ejercicio de esta facultad en el juicio o en una fase dei juicio. En fa apficación especial que nos interesa, la preclusión es fa perdida de la facultad para proponer alegaciones, de la facultad de contender”(Chiovenda, 1936: 407-414). Para Manzini, “le preclusioni processuafi, soggettivamente considerate, si referiscono soltanto alf’attivatà di coloro Che già acquistarono fa quafità di soggetti dei rapporto precssuale” (Manzini, 1956: 219).
[5] Em 2013, 40% das repercussões gerais envolviam temas de direito tributário. Disponível em: . Acesso em: 6 maio 2016.
[6] Segundo Gilmar Mendes, os institutos da repercussão geral e da súmula vinculante tem levado a uma “mudança radical do modelo de controle incidental, uma vez que os recursos extraordinários terão de passar pelo crivo da admissibilidade referente à repercussão feral. A adoção desse novo instituto deverá maximizar a feição objetiva do recurso extraordinário”(Mendes, 2007: 133). No mesmo sentido, Nelson Luiz Pinto assevera que “os recursos extraordinários(incisos VI, VII e VII do art. 496 do CPC) têm como objeto imediato a tutela do direito objetivo ou seja, das leis e tratados federais, no caso do recurso especial; da Constituição Federal, no caso do recurso extraordinário stricto sensu; e de ambos no caso dos embargos de divergência. Somente de uma forma reflexa ou mediata protegem estes recursos o direito subjetivo da parte, apesar de ser este o objeto psicológico direto quer impulsiona a parte a recorrer. Entretanto, para o sistema não importa a eventual injustiça da decisão no caso concreto, ao se examinar esses recursos, pois foram eles criados especialmente para garantir a integridade do sistema jurídico federal e o respeito à disposições constitucionais”(Pinto, 199: 32)
[7]
[8] Diz-se que “iniciou” a análise do tema, pois há um recurso extraordinário (RE 611503) com repercussão geral conhecida e pendente de apreciação pelo STF sobre o mesmo tema: “Constitucional e processual civil. Embargos à execução. Adequação dos títulos judiciais exequendos às decisões do Supremo Tribunal Federal. Parágrafo único do art. 741 do Código de Processo Civil. Coisa julgada. Presença da repercussão geral na questão constitucional discutida. Possui repercussão geral a questão constitucional atinente à compatibilidade entre a garantia constitucional da coisa julgada e o parágrafo único do art. 741 Código de Processo Civil”(RE 611503/RG, Rel. Min. Ayres Brito, Dje-109 Publ.08.06.2011, Ement. V. 02539-03,p.00443).
[9]
[10] A ADC 18 foi manejada pela União para requerer a declaração de constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins.
[11] A propósito, cumpre relembrar as posições de Chiovenda e de Porto a respeito do assunto: “Essi vedero la importanza della res iudicata non nel ragionamento Dei giudice, ma nella condanna o nella assoluzione,cioé nella espressione deilla voliontà Dei diritto net caso concreto. Perció essi non parlano di cosa giudicata se non riguardo Afiá sentenza dí mérito, La qualle é quella Che riconosce um bene deilla vita a uma deille parti” (Chiovend;:i, 1980: 907). “Dessa forma, por exemplo, fundados em textos de UI piano, juristas da idade média identificavam a autoridade da coisa julgada na presunção de verdade contida na sentença. Com efeito, para eles, a finalidade do processo era a busca da verdade; contudo tinham ciência de que nem sempre a sentença reproduzia a verdade esperada. Porém, não seria por essa circunstância que a sentença – embora injusta, eis que em desacordo com a verdade real – deixaria de adquirir autoridade de coisa julgada. Assim, diante da impossibilidade de afirmar que a sentença sempre representava a verdade material, encontravam na ideia de presunção de verdade (res iudicara pro veritate habetur) o fundamento jurídico para a autoridade da coisa julgada” (Porto, 201 L 53).
[12] MS 26603, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, J. 04.10.2007, DJe-241 Divulg. 18.12.2008, Publ.19.12.2008, Ement. v. 02346-02, p. 00318.
[13] “Constitucional e processual civil. Declaração de inconstitucionalidade de preceito normativo pelo Supremo Tribunal Federal. Eficácia normativa e eficácia executiva da decisão: distinções. lnexistência de efeitos automáticos sobre as sentenças judiciais anteriormente proferidas em sentido contrário. Indispensabilidade de interposição de recurso ou propositura de ação rescisória para sua reforma ou desfazimento. 1. A sentença do Supremo Tribunal Federal que afirma a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo gera, no plano do ordenamento jurídico, a consequência(= eficácia normativa) de manter ou excluir a referência norma do sistema de direito. 2. Dessa sentença decorre também o efeito vinculante, consistente em atribuir ao julgado uma qualificada força impositiva e obrigatória em relação a supervenientes atos administrativos ou judiciais(= eficácia executiva ou instrumental), que, para viabilizar-se, tem como instrumento próprio, embora não único, o da reclamação prevista no art. 102, I, /,da Carta Constitucional. .3. A eficácia executiva, por decorrer da sentença (e não da vigência da norma examinada), tem como termo inicial a data da publicação do acórdão do Supremo no Diário Oficial (art. 28 da lei nº 9.868/1999). E, consequentemente eficácia que atinge atos administrativos e decisões judiciais supervenientes a essa. Publicação, não os pretéritos, ainda que formados com suporte em norma posteriormente declarada inconst1tuc1onal. 4. Afirma-se! portanto, como tese de repercussão geral que a decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou resc1sao das sentenças anteriores que tenham adotado entendimento diferente; para que tal ocorra, será indispensável a mterpos1çao do recurso próprio ou, se for o caso, a propositura da ação rescisória própria, nos termos do art. 485, V, do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495). Ressalva-se desse entendimento, quanto à indispensabilidade da ação rescisória, a questão relacionada à execução de efeitos futuros da sentença proferida em caso concreto sobre relações jurídicas de trato continuado. 5. No caso, mais de dois anos se passaram entre o trânsito em julgado da sentença no caso concreto reconhecendo, incidentalmente, a constitucionalidade do art. 9° da Medida Provisória nº 2.164-41 (que acrescentou o art. 29-C na Lei nº 8.036/1990) e a superveniente decisão do STF que, em controle concentrado, declarou a inconstitucionalidade daquele preceito normativo, a significar, portanto, que aquela sentença é insuscetível de rescisão. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” CRE 730462, Tribunal Pleno, Rei. Min. Teori Zavasck1, Repercussão Geral- Mérito, DJe-177, Publ. 09.09.2015).
[14] Canotilho, 2008.
[15] RE 197.917/SP, Rei. Min. Maurício Corrêa, J. 06.06.2002, voto Ministro Gilmar Mendes.
[16] “A Constituição jurídica não configura apenas a expressão de uma dada realidade. Graças ao elemento normativo, ela ordena e conforma a realidade política e social. (. .. ]A concretização plena da força normativa constitui meta a ser almejada pelo direito constitucional. Ela cumpre seu mister de forma adequada ao quando procura demonstrar que as questões constitucionais são questões de poder, mas quando envida esforços para evitar que elas se convertam em questões de poder.” (Hesse, 1991: 26-27)
[17] Sobre a “identidade constitucional”, vide ROSENFELD, Michel. A identidade do sujeito constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. Segundo o referido autor, “para se estabelecer a identidade constitucional através dos tempos, é necessário fabricar a tessitura de um entrelaçamento do passado dos constituintes com o próprio presente e ainda com o futuro das gerações vindouras” (Rosenfeld, 2003: 17).
[18] Hesse, 1991: 20.
[19] “O instituto da coisa julgada, embora de matriz constitucional, tem sua conformação delineada pelo legislador ordinário, ao qual se confere a faculdade de estabelecer seus limites objetivos e subjetivos, podendo, portanto, indicar as situações em que tal instituto cede passo a postulados, prindp1os ou bens de mesma hierarquia, porque também juridicamente protegidos pela Constituição.” (Voto Ministro Teori Zavascki, ADln 2.418)
[20] Segundo Humberto Ávila, a proporcionalidade (“Verhãltnismãssigkeitsgrundsatz”) determina que um meio deva ser adequado, necessário – isto é, dentre todos os meios adequados aquele menos restritivo – e não deva ficar sem relação de proporcionalidade relativamente ao fim instituído pela norma. A condição negativa consubstancia-se no subelemento da proporcionalidade em sentido estrito (elemento da proibição de excesso), que exige que o meio e o fim devam estar em uma relação de proporção (não podem ficar em relação de desproporção). A condição positiva traduz-se na ponderação dos interesses, que estão (estaticamente) em posição de contraposição (“Gegenüberstellung”), os quais devem ser de tal torna ponderados, que a coordenação entre os bens jurídicos constitucionalmente protegidos possa atribuir máxima realização (“optimale Wirklichkeit”) a cada um deles. Esse é a chamada concordância prática (“praktische Konkordanz”), da qual se ocupou Hesse com rara clareza: “A fixação de limites (“Grenzziehüngen”) deve ser proporcional no respectivo caso concreto; eles não podem ir além do necessário para que
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