19 de março 2024 às 17H14
Por Dr. Mário Luiz Oliveira da Costa e Dra. Gabriela Gonçalves Barbosa
Revista do Advogado (AASP), Março/2024
O tema “igualdade racial”, objeto da Revista do Advogado nº 161, coordenada por Cristiano Scorvo Conceição e Patrícia Souza Anastácio, é extrema mente relevante, atual e abrangente. Nessa oportunidade, apresentamos considerações sobre uma de suas várias facetas, atinente à complexa inter secção entre a tributação e as questões raciais que permeiam a sociedade. Não é novidade que o siste ma tributário do Brasil, influenciado por seu passado histórico, apresenta características regressivas que impactam de maneira desproporcional a parcela mais vulnerável da população, predominantemente composta por negros. Essa desigualdade é agrava da pela grande amplitude, entre nós, da tributação indireta, focada no consumo de bens e serviços, em detrimento de um modelo mais progressivo. Como se verá, há diversas formas para mudar o triste cenário, que contrasta com as diretrizes consagra das na Constituição Federal de 1988. Dentre essas, a de construir uma sociedade justa, livre e solidária, a impor permanente busca por alternativas para uma maior equidade fiscal e social.
O Brasil adotou o escravismo colonial como modo de produção no início de sua formação, de maneira que a população negra(1) integrou a base da pirâmide social ao longo de toda a história do país. A escravidão durou 388 anos e, mesmo após a abolição, os negros foram mantidos em uma posição marginalizada, pois não houve, por parte do Estado, nenhum projeto de inclusão social dos escravizados, tampouco de seus descendentes (Gomes, 2019).
Diante dessa herança histórica, o racismo consolidou-se como um elemento estruturante na sociedade brasileira que afeta profundamente a atuação do Estado, tanto pelas escolhas políticas adotadas quanto pela ausência de efetivo enfrenta mento da questão racial e de suas consequências.(2)
A proporção de pessoas abaixo da linha da
pobreza no Brasil é de 18,6% entre os brancos
e o quádruplo entre os negros (72,9%).
As estatísticas demonstram a profunda desigualdade racial no país. De acordo com os dados da pesquisa “Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil”, divulgada em 2022 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2022, p. 2), a propor ção de pessoas abaixo da linha da pobreza no Brasil é de 18,6% entre os brancos e praticamente o quádruplo entre os negros (72,9%). Segundo dados noticiados no BAASP nº 3183 (AASP, 2023, p. 12), a
média salarial de homens e mulheres negros é 30% inferior à de homens e mulheres brancos, ou, pior, o rendimento médio de pessoas brancas ocupadas é 73,9% superior ao da população preta ou parda. Se mantido o ritmo de inclusão de negros obser vado, a equiparação de sua renda média com a dos brancos ocorrerá somente em 2089.(3)
Ainda que tenhamos formalmente superado os horrores da escravidão há mais de 135 anos e obser vado avanços significativos na conscientização de todos para a necessidade de uma efetiva igualdade racial,(4) lamentavelmente o preconceito e o racismo persistem em várias formas.(5) Assim, apesar dos esforços já realizados, a luta pela igualdade racial continua a demandar extenso e contínuo trabalho.
No que respeita especificamente à tributação, é possível verificar que o sistema tributário penaliza mais as pessoas negras. Se, durante o regime escravista, os negros escravizados viviam sob a condição de serem objetos tributados,(6) nos dias de hoje, a população negra, enquanto grupo social que possui a menor renda, encontra-se em uma situação desfavorável frente ao sistema tributário brasileiro.
Isso se deve ao fato de que, historicamente, a tributação indireta tem elevado peso no Brasil,(7) o que atribui à tributação o aspecto de regressiva, especialmente porque os mais pobres destinam quase toda a sua renda ao consumo. Já a camada mais abastada da população dispõe de um excedente de renda em relação às suas despesas. Além disso, suas cestas de consumo incluem uma proporção maior de serviços, os quais geralmente se sujeitam à carga tributária inferior àquela imposta aos produtos, resultando em um impacto reduzido da tributação indireta sobre esse grupo (Instituto de Estudos Socioeconômicos, 2023, p. 30).
Referido panorama deve ser compreendido em diálogo com o cediço quadro de racismo estrutural presente no Brasil, em que a população negra ocupa, historicamente, posições às margens da sociedade. Estudos recentes mostram que aproximadamente 77% das pessoas nos 20% mais pobres da população são negras. Entre os 20% mais pobres, a incidência dos tributos sobre a renda é de 21,3%, em comparação com 18,7% para os 20% mais ricos (ibidem).(8) Essa discrepância é injusta, considerando que a renda média mensal per capita para os mais pobres é de R$ 311,00, enquanto para os mais ricos é de R$ 5.268,00. Somado a isso, em famílias chefiadas por pessoas negras, a incidência de tributos indiretos na renda total é maior em compara ção com as chefiadas por brancos – 10,8% contra 9,7% (ibidem).(9)
Para exemplificar como o peso dos tributos sobre o consumo no Brasil impacta desproporcionalmente os mais pobres, sobretudo a população negra, considere-se o seguinte cenário hipotético e exemplificativo: um porteiro e um engenheiro compram o mesmo modelo de televisão. O porteiro possui uma renda de R$ 2.200,00, ao passo que o engenheiro possui uma renda de R$ 13.200,00. Como a televisão custa R$ 1.000,00, no preço final estão embutidos R$ 400,00 em tributos.(10) Os tributos da televisão correspondem a 18% da renda do porteiro e a 3% da renda do engenheiro.
Portanto, no exemplo hipotético (mas bastante condizente com a realidade), os tributos pesam seis vezes mais na renda do porteiro em comparação ao peso na renda do engenheiro. Embora ambos tenham sofrido a mesma tributação, eles não demonstram a mesma capacidade contributiva em função de suas possibilidades econômicas.(11)
Essa pequena crônica do cotidiano demonstra como a matriz tributária brasileira,(12) ao privilegiar a tributação do consumo em detrimento da renda e do patrimônio, é cruelmente regressiva,(13) de modo a onerar mais quem possui menor capacidade contributiva, como uma espécie de “Robin Hood às avessas”, que distribui a riqueza dos mais pobres para os mais ricos (Leal, 2016).
A grande participação dos tributos indiretos, regressivos e pouco transparentes,(14) na carga tributária total, acaba por onerar de forma mais gravosa os contribuintes de menor capacidade contributiva, negros em sua grande maioria.
Portanto, é possível verificar a presença da raça(15) como um marcador que contribui para delimitar os grupos e os sujeitos que pagam um percentual maior de sua renda, a título de tributos, em comparação com o percentual de renda desembolsado para o mesmo fim pelos mais ricos.
Como se sabe, não basta não ser racista ou apenas colocar-se, passivamente, contra o racismo. É necessário combater o racismo e promover a igual dade racial ativamente. A mesma necessidade se estende também ao campo do Direito Tributário.
A matriz tributária brasileira é cruelmente
regressiva, de modo a onerar mais quem
possui menor capacidade contributiva.
Um sistema tributário que simplesmente não seja mais oneroso para a população negra, ainda que extremamente bem-vindo, não será o bastante. Torna-se imperativo implementar políticas públicas no sistema tributário que contribuam concreta e decisivamente para a inclusão e a igualdade da população negra. Essas políticas devem ir além de evitar o agravamento das desigualdades; devem buscar, ativamente, derrubar as barreiras raciais e promover a equidade.
O papel do sistema tributário é fundamental para alcançar uma sociedade justa, livre e solidária, um dos objetivos fundamentais de nossa República estabelecidos na Constituição Federal.(16) As decisões políticas sobre como e o que tributar possuem impacto direto nos indicadores de equi dade e influenciam significativamente a distribuição de riqueza e recursos.
De fato, embora negros e brancos sejam iguais em termos de humanidade, direitos e dignidade (lamentavelmente, muitas vezes desrespeitados), a realidade brasileira frequentemente os coloca em patamares distintos devido a diferenças marcantes em aspectos sociais e econômicos. Essas “desigualdades da vida real” justificam a necessidade de um tratamento tributário diferenciado, a elas proporcional e atendidos os critérios de adequação e razoabilidade.
Assim, implementar medidas voltadas à diminui ção de desigualdades sistêmicas realmente honra o princípio da isonomia, cuja indispensável observância remonta a Aristóteles. É imperioso tratar de maneira equitativa aqueles em situações iguais e de forma diferenciada aqueles em circunstâncias desiguais, de acordo com a extensão dessas diferenças, o que possui especial relevância no contexto da redução da desigualdade racial.
Desse modo, o presente tópico busca alternativas para reduzir a regressividade do sistema tributário brasileiro em relação à população negra, bem como possíveis incentivos fiscais para a realização da igualdade material, visando a uma justiça fiscal mais efetiva e a uma sociedade mais igualitária.
Uma maior participação dos tributos diretos e progressivos na arrecadação total para financiar serviços públicos e o incremento, observados os critérios de adequação e razoabilidade, das transferências de caráter distributivo em muito auxiliariam a redução da desigualdade racial no âmbito da tributação. Essas políticas assistenciais podem ser ferramentas eficazes na redistribuição de renda e na atenuação dos impactos regressivos da tributação. Porém, como visto, com uma tributação regressiva, os recursos destinados às transferências são extraídos, em grande parte, dos mais pobres, o que agrava as desigualdades ao invés de mitigá-las.
Outra possível alternativa para alcançar maior justiça fiscal seria a ampliação de incentivos fiscais ou deduções específicas que possibilitassem à população de baixa renda alocar uma parcela menor de seus ganhos para o pagamento de tributos. Isso seria particularmente importante para bens e serviços de primeira necessidade, como é o caso de itens da cesta básica, saúde, transporte e educação.
Atualmente, os produtos que compõem a cesta básica são isentos de tributos federais, mas estão sujeitos ao ICMS, cujas alíquotas variam conforme a unidade da federação envolvida. É fato que, após intenso debate sobre a reformulação do sistema tributário brasileiro, com o objetivo principal de simplificar a tributação sobre o consumo, veio a ser aprovada a Emenda Constitucional nº 132 (oriunda da PEC nº 45), com a criação dos novos IBS e CBS, incidentes sobre o valor agregado. A proposta inicial previa alíquotas uniformes desses tributos para todos os produtos e serviços, sem distinção entre itens de primeira necessidade, luxo ou supérfluos. Essa abordagem, entretanto, gerou controvérsias, máxime pela possibilidade de aumentar a carga tributária sobre a cesta básica. Como resposta às críticas, surgiu a proposta de criar a “Cesta Básica Nacional de Alimentos”, tendo sido a ela assegura da, no texto constitucional, a redução a zero das alíquotas dos referidos novos tributos.
Além disso, a reforma da tributação do consumo autorizou a implementação de um sistema de devolução de parte do imposto único para a população de baixa renda (cashback). A perspectiva pode ser interessante sob o ponto de vista da luta antirracista, pois a população mais pobre, em sua grande maioria, é negra. É importante destacar que a devolução dos tributos incidentes sobre a venda de bens e serviços não se confunde com benefícios assistenciais de transferência de renda, mas deve ser implementada de maneira complementar a tais políticas. Essa diferenciação é indispensável para afastar a proposta de devolução de tributos do campo de futuros contingenciamentos ou disputas orçamentárias. Afinal, o fato de tal devolução estar prevista não é necessariamente garantia de que será efetivada pelos governos em cenários de crise e ajuste fiscal (D’Araújo; Alves, 2022).
Os reconhecidos avanços, contudo, a par de ainda pendentes de regulamentação e implementação, são insuficientes. Tal como as medidas direcionadas à tributação do consumo, é possível pensar na concessão de incentivos fiscais ou deduções específicas no imposto de renda das pessoas físicas e/ou jurídicas como forma de estimular a mobilidade social da população negra.
Por exemplo, retomar a dedução do IRPF dos valores referentes à contribuição previdenciária paga aos trabalhadores e trabalhadoras domésticos, anteriormente prevista pela Lei nº 13.097/2015, seria uma medida interessante para incentivar a formalização desses empregos, historicamente marcados pela informalidade. O Brasil conta com cerca de 6,2 milhões de pessoas empregadas no serviço doméstico remunerado. Desse total, 3,9 milhões são mulheres negras.
A maior parte desses trabalhadores ainda atua sob condições de informalidade. A situação de informalidade nega a esses trabalhadores acesso a direitos e perpetua desvantagens. A formalização dessas relações é crucial para melhorar as condições de vida e trabalho, garantindo direitos como férias, licenças e uma aposentadoria segura (Piscitelli et al., 2020).
Na mesma linha, permitir a dedução no IRPF de despesas educacionais dos trabalhadores domésticos e seus descendentes diretos, pagas pelos empregadores, pode ser uma medida impactante na promoção da mobilidade social, principalmente da população negra. A medida visa ampliar o acesso à educação, um dos principais mecanismos de ascensão social, e estimular empregadores a apoiar a educação de seus empregados e dependentes,
respeitando o limite legal para despesas educacionais. Essa abordagem tem o potencial de oferecer melhores oportunidades profissionais e salariais, particularmente para mulheres negras (a maioria nesse setor, como já referido), permitindo-lhes buscar empregos mais alinhados com suas aspirações e habilidades. O acesso universal ao ensino fundamental e as políticas de cotas e financiamento estudantil já mudaram os horizontes profissionais para muitas mulheres. Enquanto a média de anos de estudo para empregadas domésticas era de 3 a 4 anos em 1995, hoje já é de aproximadamente 8 anos, com sólida expectativa de que essa realida de continue melhorando (Pinheiro et al., 2019).
Além de providências em prol da redução de desigualdades e voltadas a classes sociais ou setores de atividade predominantemente (ainda que não exclusivamente) integrados por negros, é igualmente essencial a implementação de medidas direcionadas à eliminação do racismo entre nós.
É possível pensar na concessão de deduções específicas
no imposto de renda como forma de estimular a
mobilidade social da população negra.
Uma efetividade ainda mais direta em prol da igualdade racial poderá ser obtida com a concessão de benefícios fiscais a empresas que demonstrem comprometimento com sua promoção. Isso pode ser estruturado por meio de incentivos progressivos, com maiores benefícios para aquelas empresas que mantenham determinados percentuais (superiores à média) de funcionários negros, particularmente em cargos de liderança ou funções de maior importância. Incentivos adicionais podem ser oferecidos para empresas que invistam em bolsas de estudo para pessoas negras ou em iniciativas de letramento racial. Essas ações também poderiam ser favorecidas pela autorização de dedução das respectivas despesas quando da apuração da renda e do lucro tributáveis (pelo IRPJ e pela CSLL), fomentando assim um papel mais ativo do setor empresarial na promoção da igualdade racial.
Adicionalmente, a implementação de programas nacionais voltados especificamente para o apoio e fomento do afroempreendedorismo pode ser um passo significativo na reparação histórica de séculos de opressão e, mais do que isso, uma estratégia interessante para o desenvolvimento socioeconômico sustentável. A realidade do mercado de trabalho, marcada pela precarização e pelo crescimento do setor informal, impacta desproporcionalmente a população negra, que apresenta os maiores índices de desemprego. Dessa forma, o afroempreendedorismo não é apenas uma escolha, mas uma necessidade crítica para muitas dessas pessoas, a merecer apoio através de políticas fiscais incentivadoras e diferenciadas. Tais programas podem incluir acesso a linhas de crédito favoráveis, com subsídios governamentais, redução de carga tributária e oferecimento de cursos especializados em planejamento e gestão focados no afroempreendedorismo (Santos, 2019).
Em suma, as estratégias referidas neste tópico visam não apenas evitar agravamentos das disparidades existentes, mas, também, promover ativa mente a inclusão e a igualdade para a população negra. Diversos são os meios possíveis para tanto, como por intermédio de políticas públicas eficazes, de reformas tributárias que priorizem a progressividade ou do alívio fiscal para os mais pobres, sobretudo em bens e serviços essenciais. Essas e tantas outras providências podem ser indutoras de maior igualdade racial também da perspectiva tributária, alinhando o Direito Tributário com os princípios de isonomia e justiça social. Assim, busca-se criar uma sociedade mais justa, livre e solidária, em sintonia com os valores consagrados no âmbito constitucional.
A luta contra toda forma de discriminação e preconceito requer mais do que uma postura passiva, exige ações ativas e políticas públicas efetivas, inclusive na esfera tributária. Repensar a matriz tributária sob uma perspectiva de raça, buscando as correlações do racismo estrutural com a (in)justiça fiscal, revela-se de suma importância para o debate acadêmico e político para que a tributação possa cumprir seu papel social não só como financiado ra das políticas públicas, mas, fundamentalmente, como garantidora de uma maior justiça social.
O debate sobre tributação e raça, antes inexistente ou incipiente, está em constante evolução no Brasil. O sistema tributário brasileiro, influenciado por um passado marcado pela desigualdade racial e econômica, perpetua a marginalização da população negra. A regressividade dos impostos indiretos e a falta de medidas concretas que mitiguem esses efeitos contribuem para a manutenção das desigualdades raciais.
Há inúmeras alternativas para mitigar as desigualdades existentes e promover ativamente a inclusão e a equidade para a população negra. As propostas ora comentadas, longe de pretende rem esgotar o tema, objetivam contribuir para uma maior conscientização acerca de sua importância e, em especial, para a real adoção de providências que combatam o racismo ativamente e assegurem um sistema tributário em harmonia com os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição Federal de 1988, buscando um país mais igualitário e solidário.
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(1) Assim considerado, nos termos do art. 1º, inciso IV, da Lei nº 12.288/2010, “o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam autodefinição análoga”.
(2) “O racismo estrutural corresponde a um sistema de opressão cuja ação transcende a mera formatação das instituições, eis que perpassa desde a apreensão estética até todo e qualquer espaço nos âmbitos público e privado, haja vista ser estruturante das relações sociais e, portanto, estar na configuração da sociedade, sendo por ela naturalizado. […] Ele transcende o âmbito institucional, pois está na essência da sociedade e, assim, é apropriado para manter, reproduzir e recriar desigualdades e privilégios, revelando-se como mecanismo colocado para perpetuar o atual estado das coisas.” (Bersani, 2018, p. 175).
(3) Cálculos da Oxfam Brasil, com base na média de crescimento relativo da renda da população negra em relação à da população branca entre 1995 e 2015 (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2017).
(4) No campo normativo, destacam-se as Leis n 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (e alterações posteriores regulando os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor), e 12.288, de 20 de julho de 2010 (que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial – EIR).
(5) O preconceito racial é um julgamento baseado em estereótipos sobre indivíduos de grupos racializados. Diferentemente do racismo, que é definido por seu caráter sistêmico, o preconceito racial se manifesta mais frequentemente como uma atitude individual baseada em noções estereotipadas. A sinofobia (contra pessoas chinesas ou asiáticas de maneira geral) e o antissemitismo (contra judeus) são exemplos de preconceitos. O preconceito racial e o racismo são ambos nocivos e inaceitáveis, mas é essencial distingui-los para combater eficazmente seus efeitos. No contexto brasileiro, o racismo não se restringe a atos discriminatórios, mas se trata de um processo histórico, relacionado à escravização, em que a população negra foi submetida a uma condição de subalternidade que se reproduz nos âmbitos da política, da economia e das relações cotidianas (sobre o conceito de preconceito racial e racismo, ver Almeida, 2019).
(6) Na legislação em vigor no Período Colonial, os escravizados eram classificados como bens móveis (Boxer, 1969, cap. 7).
(7) Em 2021, a carga tributária brasileira era da ordem de 33% do PIB, sendo 54% da arrecadação proveniente da tributação direta e 46% da indireta (Secretaria do Tesouro Nacional, 2022). O dado de 33% se refere à proporção de arrecadação total em relação ao PIB. Já os dados de 46% de tributação indireta x 54% de direta se referem às porcentagens da carga tributária global.
(8) Esses dados se referem à carga tributária em relação à renda média das famílias.
(9) Esses dados se referem à carga tributária indireta incidente sobre a renda, dividindo a população brasileira segundo a cor da pessoa de referência da família.
(10) Considerando-se a carga tributária atual de aproximadamente, 40% em relação a esse tipo de produto.
(11) “O princípio da capacidade contributiva não pergunta pela vantagem que o contribuinte tem dos serviços públicos, ou quais custos ele causa ao Estado, mas apenas com quanto o contribuinte pode contribuir para o financiamento do Estado em razão de sua renda disponível […]. O Estado Tributário não pode retirar do contribuinte aquilo que, como Estado Social, tem de lhe devolver. Deste modo, o princípio da capacidade contributiva significa: todos devem pagar impostos segundo o montante da renda disponível para o pagamento de impostos.” (Sousa, 1943; Tipke, 2002, p. 31).
(12) A matriz tributária é a base para a criação de um sistema tributário e pode ser conceituada como “o resultado das escolhas feitas em um determinado momento histórico no campo da ação social no que diz respeito ao fenômeno tributário.” (sobre o conceito de matriz tributária, ver Gassen, 2016, p. 4).
(13) “Todo tributo, por ser uma prestação pecuniária a ser prestada pelo contribuinte, significa um ônus. Considerando a onerosidade atribuída ao sujeito passivo da relação jurídica tributária, os tributos podem ser classificados em regressivos e progressivos. Será regressivo quando cresce a onerosidade relativa em razão inversa da capacidade contributiva do contribuinte. Será progressivo quando cresce a onerosidade relativa em razão direta à situação econômica do sujeito passivo.” (Gassen, 2004, p. 75).
(14) Segundo Valcir Gassen, os tributos que incidem sobre o consumo são “anestesiantes”, porque reduzem a capacidade do cidadão comum de “sentir” o peso dos tributos sobre suas rendas. Em outras palavras: “você paga e não sente.” (Gassen, 2004, p. 75).
(15) Embora não existam diferenças biológicas ou culturais que justifiquem um tratamento discriminatório entre seres humanos, o termo “raça” diz respeito a um elemento essencialmente político, sem qualquer sentido fora do âmbito socioantropológico. A noção de raça é um fator político importante, utilizado para naturalizar as desigualdades e legitimar a segregação de grupos socialmente considerados minoritários. No Brasil, a raça não pode ser vista fora da relação colonial; a raça constitui um instrumento de dominação que surge com a escravização (Almeida, 2019, p. 20-21).
(16) 3º da Constituição Federal de 1988: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”.
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