27 de fevereiro 2020 às 9H42
Em novas ações, governo tenta reduzir ou eliminar indenizações geradas por intervenção
A Advocacia-Geral da União (AGU) iniciou uma ofensiva para reduzir – ou até eliminar – um enorme passivo com usinas e destilarias, com base em decisão do Superior Tribunal da Justiça (STJ). Em apenas sete ações rescisórias, o órgão discute pagamentos determinados pelo Judiciário que somam R$ 20 bilhões.
A estratégia foi adotada porque o STJ definiu que as usinas devem comprovar, por meio de documentos contábeis, os prejuízos obtidos com a intervenção do governo nos preços da cana-de-açúcar, do açúcar e do álcool nos anos 90. A AGU também aguarda a palavra do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2015, os ministros decidiram julgar com repercussão geral o dano e responsabilidade da União pela fixação de preços (ARE 884325).
As ações rescisórias são propostas pela AGU para mudar decisão já finalizada – que transitou em julgado. Só uma das sete responde por quase todo o valor e corre em segredo de justiça.
Na última ajuizada, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região autorizou a suspensão do pagamento de aproximadamente R$ 130 milhões a uma destilaria que alegava ter sofrido prejuízo entre agosto de 1993 e abril de 1997. “São valores fora da realidade, que não consideram os custos efetivos das usinas para produzir”, diz Alexandre Dantas, chefe da Divisão de Atuação Estratégica da Procuradoria-Regional da União.
Nos processos ajuizados nos anos 90, usinas e destilarias alegaram que os preços fixados pelo governo, por meio do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), não cobriram os custos médios apurados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e, portanto, teriam sofrido grandes prejuízos.
Judicialmente, as usinas venceram a disputa em 2013. Em repetitivo, a 1ª Seção do STJ reconheceu que as medidas causaram prejuízos. As correções foram limitadas até 1991, quando o sistema de preços foi alterado. O STJ, porém, exigiu a comprovação de danos sofridos, por meio de balanços contábeis, o que abriu um novo campo de batalha. “As empresas precisam comprovar o direito que estão alegando”, afirma Dantas.
Segundo o advogado público, se para obrigações fiscais as empresas têm que guardar documentos por cinco anos, para comprovar o direito nessas ações teriam que ter os arquivos para poder comprovar o que defendem a qualquer momento.
“O que nos preocupa é o uso de uma fórmula para obter os valores de indenização”, diz Dantas. Ele acrescenta que as perícias realizadas nos processos pegavam preços fixados pelo IAA, os custos médios que a FGV apurava e calculava a diferença entre eles multiplicando pelos produtos vendidos no período.
Além das rescisórias, há casos em que a União ainda tenta nos processos em trâmite pedir a apresentação de documentos para saber o efetivo prejuízo sofrido no período. O Departamento de Cálculo e Perícia da AGU tem se especializado no assunto. De acordo com Dantas, está sendo feita uma ofensiva agora porque, como os casos são antigos, os processos passaram por épocas mais conturbadas na autarquia, com menor quadro de advogados.
“Há casos em que estamos na segunda rescisória”, afirma o advogado Daniel Correa Szelbracikowski, do escritório Dias de Souza. O problema, de acordo com ele, não é apresentar as contas já que muitas usinas ainda possuem os documentos, mas a demora para se submeter a outro processo de liquidação para mostrar os mesmos documentos que já foram vistos pelo perito judicial da ação originária. “Tomará, no mínimo, mais 15 anos de debates no Judiciário em ações que já tramitam por 30 anos.”
Para o advogado Marcelo Guaritá, do escritório Peluso, Stupp e Guaritá Advogados, se permanecer o entendimento do STJ, muitas empresas terão dificuldades para apresentar os documentos e obter o ressarcimento. “As empresas estavam acreditando que valeria o estudo da FGV”, diz. “Agora, depois do tempo que passou e com as oscilações que o setor sofreu nos últimos anos, há o risco de as usinas ganharem e não levarem”. O advogado acredita que o STF ainda vai acabar definindo a forma como o dano pode ser quantificado.
De acordo com ele, considerando que o Código de Processo Civil de 2015 ampliou as hipóteses de uso da ação rescisória, AGU e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) tentam agora mitigar danos. “A discussão de exclusão do ICMS destacado ou recolhido da base do PIS e da Cofins passa por aí”, afirma, citando a tese bilionária para a União que poderá ser finalizada no dia 1º de abril. “Penso que essa não é a função da rescisória.
Ela deveria ser usada em situações muito restritas.”
Jornal Valor econômico , Brasília, 27 de fevereiro de 2020 às 05h01
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