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21 de outubro 2020 às 9H11

Contribuinte perde R$ 500 bi no STF

Fazenda Nacional vence 31 dos 37 julgamentos tributários realizados até setembro

Os contribuintes nunca perderam tantas disputas no Supremo Tribunal Federal (STF) como neste ano. Em meio a uma alta produtividade dos ministros, a Fazenda Nacional saiu vencedora em 31 dos 37 julgamentos tributários realizados até setembro. Vitórias que evitaram a saída de aproximadamente R$ 500 bilhões dos cofres públicos.

A maioria das discussões fiscais vem ocorrendo por meio de julgamentos virtuais. Neles, o Plenário não se reúne nem virtualmente com cada ministro votando em tempo real. Cada um deposita seu voto e o sistema indica a unanimidade, maioria ou pedido de vista.

Com esse formato, o número de teses tributárias julgadas entre janeiro e setembro foi maior que a soma dos três últimos anos juntos. Entre 2016 e 2019, os ministros decidiram 25 temas tributários com repercussão geral. A Fazenda obteve êxito em 20.

Se contabilizado em reais, o placar, só neste ano de 2020, está em R$ 512,27 bilhões para a União contra R$ 48,13 bilhões para os contribuintes. Os dados constam no relatório de atividades de acompanhamento especial da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STF.

Trata-se de um recorde. É como se a União tivesse recuperado duas vezes o prejuízo estimado para a sua maior derrota na Corte: a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A chamada “tese do século” foi julgada em 2017 e tem impacto previsto em R$ 250 bilhões. Mas ainda há embargos de declaração pendentes para que se tenha, enfim, um desfecho.

Grande parte da quantia envolvida nos processos julgados neste ano é referente a um caso que só dependia de finalização formal. Trata-se da validade dos regimes do PIS e da Cofins.

Os ministros, por maioria, declararam constitucionais o aumento da alíquota do PIS de 0,65% para 1,65% e a instituição do regime da não cumulatividade, que permite às empresas usar créditos e reduzir a tributação.

Outras quatro teses também concluídas neste ano concentraram R$ 145 bilhões. Em uma delas, os ministros decidiram que as empresas têm que pagar IPI ao revender produtos importados. Só nesse julgamento, a Fazenda Nacional conseguiu evitar a perda de R$ R$ 56,3 bilhões. O tema estava na fila, à espera de uma decisão, desde 2016.

A validade da cobrança do adicional de 10% sobre a multa do FGTS nos casos de demissão sem justa causa também integra a lista dos quatro casos bilionários. O percentual era cobrado do empregador até dezembro do ano passado. A expectativa das empresas com o julgamento era de que pudessem receber os valores pagos no passado – o que provocaria um impacto de até R$ 36 bilhões para a União.

Em um outro julgamento, contrariando as expectativas do mercado, o STF decidiu que as empresas devem recolher contribuição previdenciária sobre o terço de férias. Com isso, reformaram decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em repetitivo, ou seja, que orientava primeira e segunda instâncias, em sentido contrário.

Completa a lista dos casos mais custosos o processo em que se discutiu a validade da cobrança de 0,6% sobre a folha de salário das empresas para o custeio do Sebrae, Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) e Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). O prejuízo poderia superar R$ 20 bilhões.

Dos cinco temas mais valiosos para a União, só um deles, sobre o Sebrae, não foi concluído no Plenário Virtual – apesar de as discussões terem se iniciado nesse ambiente.

Nesta plataforma não há interação em tempo real. Os advogados gravam as suas sustentações orais e disponibilizam no sistema. Já os ministros têm prazo de uma semana para depositar os seus votos. Não há um debate de ideias visível ao público.

Uma das explicações para a quantidade de julgamentos realizados pode estar no fato de os próprios relatores e os ministros com voto-vista terem o poder de incluir os processos na pauta. No plenário físico – em que as sessões, atualmente, ocorrem por meio de videoconferência – o controle do que será analisado é do presidente da Corte.

“Com o Plenário Virtual os casos foram desengavetados”, afirma Felipe Dutra, professor de planejamento tributário do Ibmec. O placar favorável à Fazenda, diz, pode estar atrelado ao momento de crise e ao peso que seria provocado com o passivo e as perdas na arrecadação.

A advogada Cristiane Romano, sócia do escritório Machado Meyer, afirma que os clientes estão assustados “com a avalanche de decisões contrárias”.

Assim como o momento é ruim para União, frisa, o mesmo ocorre com as empresas, que também sofrem com os efeitos da crise.

“É um desastre o que aconteceu neste ano no STF” afirma Daniel Correa Szelbracikowski, sócio do escritório Advocacia Dias de Souza. Para o advogado, o ponto não é o Supremo ter “passado o trator” nos contribuintes, mas sim deixar em dúvida a observação de garantias do devido processo legal. “O Supremo limpou parte de sua pauta com debates superficiais.”

Já para o coordenador da atuação da PGFN no STF, Paulo Mendes, a diferença deste ano para os anteriores está no número de julgados. Muitos casos tributários até chegavam a ser pautados no plenário presencial, mas acabavam não sendo julgados por falta de tempo nas sessões. Com o virtual, diz, esse problema acabou.

Mendes entende que a prevalência de decisões a favor da União mostra que, em geral, quem aplica as leis tributárias no Brasil segue a Constituição Federal nas suas interpretações. “Isso demonstra que, em regra, o legislador age constitucionalmente, apesar de existirem tantos questionamentos no Judiciário”, afirma. Por isso, conclui, a regra é manter o entendimento da Receita Federal.

Jornal Valor econômico , Brasília, 21 de outubro de 2020 às 05h01

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