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25 de setembro 2023 às 19H03

Anuário da Justiça 2023 – Contencioso Administrativo

A primeira instância do con tencioso administrativo fiscal é dominada por pro­ cessos envolvendo o IRPF e a Cofins: 95.650 e 27.194 casos estavam em tramitação, respectivamente, até janeiro de 2021, nas DRJs, das delega­cias de Julgamento da Receita Federal. O mapeamento dessas informações consta no “Diagnóstico do Contencioso Tributário Administrativo”, fruto de uma parceria entre a Receita Federal e o Banco Interamericano de Desenvol­vimento (BID), realizado pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ). De acordo com o relatório, o maior volume de decisões na esfera federal está concentrado em disputas envolvendo PIS/Cofins, com 22.127 decisões.

Na esfera estadual, o ICMS lidera, com mais de 100 mil decisões. Já na esfera municipal, o IPTU também aparece no topo do ranking, com cerca de quatro mil decisões. A participa­ção de cada tributo na arrecadação federal também foi aborda­ da no estudo, a partir dos dados da Receita Federal no período de janeiro de 2012 a ou­tubro de 2021.

O relatório procurou fazer a comparacão com o volume de processos no Carf, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, a instância de revisão administrativa das autuações fiscais feitas pela Receita Federal, onde muitas vezes são canceladas as autuacoes equivocadas.

Dentre os tributos com maior  participação em volume processual foram identificados: IRPF (14,6%), Cofins (11,8%) e Contribuições Previdenciárias (10,7%). Em volume financeiro, destacam-se: Cofins (29.8%), IRPJ (20,8%) e CSLL (10,9%).

O Carf é o órgão julgador na esfera administrativa de maior influência na definição de doutrina e política tributária. O colegiado integra a estrutura do Ministério da Fazenda e é formado por representantes dos contribuintes e da Fazenda Nacional. A atribuição do órgão é a de julgar, em segunda instância administrativa, litígios tributarios e aduaneiros. E dividido em três seções com competências específicas para julgamento em razão da matéria, além de contar com quatro câmaras, 15 turmas ordinárias e nove turmas extraordinárias. Sua competência está limitada a causas  com valores acima de 60 salários-mínimos (R$ 79.200).

O conselho foi abalado por crises sistêmicas nos últimos anos, resultando em transformações em sua estrutura normativa. A crise de maior repercussao midiátíca decorreu da chamada operação zelotes, investigação criminal iniciada em 2015 envolvendo atividades suspeitas de conselheiros e empresas que resultou em muito barulho e poucas condenações. Além dessa fonte geradora de  desconforto, o funcionamento do órgão tem sido sistematicamente prejudicado nos últimos anos por movimentos reivindicatórios dos conselheiros fazendários.

Uma das respostas imediatas à zelotes foi o enxugamento do órgão em 40%. Em junho de 2015, o novo Regimento Interno passou a prever composição completa de 130 conselheiros e 18  suplentes, ante os 216 anteriores. Outra mudança foi a adoção de mecanismos de cobrança por morosidade.

Instrumento questionado há anos, o “voto de qualidade” foi alterado no Lesislativo recentemente e movimenta ações no STF. Ele dá poder ao presidente das turmas, sempre um conselheiro fazendário, para dar o voto de desempate. A época da operação, o regimento passou a prever que, na ausenda do presidente no julgamento, assume o conselheiro fazendário mais antigo. Antes, quem dava seguimento aos trabalhos do colegiado era o vice, sempre um conselheiro representante do contribuinte.

Em 2020, o voto de qualidade foi extinto com a publicação da Lei 13.988, originária da Medida Provisória do Contribuinte Legal (MP 899/2019), estabelecendo que os empates passariam a ser decididos a favor do contribuinte. O dispositivo foi incluído na MP pelo Congresso e mantido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Três anos depois, já no início do governo Lula, o voto de qualidade  foi restabelecido em sua forma original (pró-Fisco) a partir de outra Medida Provisória (MP 1.160/23), que caducou em junho. O período de vigência da MP foi conturbado e cheio de críticas, levando os contribuintes a recorrerem ao Judiciário para impedir o julgamento dos processos com esse formato. Tida pelo governo como essencial para recomposição dos fundos públicos, a volta  do voto de qualidade voltou a ser pleiteada na forma do Projeto de Lei 2.834/2023, que ingressou na pauta de discussão do Congresso juntamente com os proetos de Reforma Tributária e do  arcabouço Fiscal. Assim como a reforma tributária, a reforma do Carf foi aprovada na Câmara em julho de 2023 e seguiu pra discussão no Senado.

Um dos críticos desse vaivém e das mudanças nos rumos do conselho visando aumentar a arrecadação é o tributarista Hamilton Dias de Souza, cujo escritório leva seu nome e é um dos mais conceituados na área. Imaginar que nós tenhamos um órgão fiscal que não tenha a função de decidir de forma imparcial, mas que decida arrecadar mais, interfere nas relações delicadas entre Fisco e contribuinte. Prejudica o ambiente de negócios, prejudica as empresas, aumenta o custo Brasil e prejudica a todos nós, afirmou em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico.

Apesar de toda celeuma levantada em torno do voto de qualidade no Carf, é relativamente baixo o percentual de decisões tornadas a partir do voto deste dispositivo. Levantamento recente do Carf mostra que, historicamente, a maioria das decisões no conselho é tornada por unanimidade, reflexo da pacificacão de temas e certa concordância entre os conselheiros dos contribuintes e fazendários. As decisões por voto de qualidade só não são menores do que o empate pró-contribuinte, vigente a partir da Lei 13.988/2020 até dezembro de 2022, e retomada agora.

A questão principal, assim, perpassa pelas altas cifras envolvidas nos casos, já que o voto de qualidade foi responsável pela média de 17,5% do volume financeiro julgado pelo órgão, de acordo com o Diagnóstico Tributário Contencioso, feito pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco) com base em dados do Carf. Em 2019, o valor dos processos decididos a  favor do Fisco foi estimado em R$ 74 bilhões.

Quando se trata de estoque processual, o Carf identificou pouco mais de uma centena de processos responsáveis pelo movimento de valores que podem ultrapassar R$ l bilhão. A maioria do acervo (32.532 processos) envolve entre R$ 78,1 mil aR$ 1,3 milhão.

Pesquisadores do Núcleo de Tributaçâo do Insper mapearam os processós do tribunal administrativo de 2018 a 2020 e identificaram 10.875 decisões cujo tema era o IRPJ (vale ressaltar que um processo pode tratar de mais de um tema). Destrinchando o tema do IRPJ, em 2022, estavam entre os macrotemas mais frequentes na pauta do tribunal administrativo: direitos creditórios, IRRF e saldo negativo; penalidades, estimativas mensais, omissão de receifas, glosa de despesas e ágio.

De acordo com dados do Insper, a maioria dos processos sobre IRPJ dizia respeito ao saldo negativo: 4.460 casos cujo valor total chegava a R$ 14,8 milhões. Em relação ao valor por objeto, a discussão sobre ajustes no lucro líquido do exercício se destaca com valor total chegando a R$ 257,7 milhões em 1.101 processos. Custos, despesas operacionais e encargos somaram R$ 124,1 milhões, com 1.082 processos.

Com a pandemia de covid-19, iniciada em 2020, o Carf adotou os julgamentos virtuais para os casos de até R$ 36 milhões – trava derrubada recentemente. Com o limite de valor, as sessões de  julgamento foram esvaziadas de processos polémicos, deixando pendentes discussões sobre ágio, por exemplo, porque ultrapassavam o teto. Ágio é tido como um dos temas mais complexos de análise, tratando da diferença entre o patrimônio líquido contábíl da empresa e o que é pago em aquisição. Parte do valor pode ser amortizado, ou seja, pode ser usado para dedução do IRPJ e aproveitado até cinco anos após seu recolhimento.

Outra alteração do novo governo foi a edição de portaria instituindo a Delegacia de Julgamento Recursal da Receita Federal (DRJ-R), cujo objetivo será o de coordenar o julgamento em segunda instância de processos cujo valor não supere mil salários-mínimos. De acordo com o governo, o objetivo é harmonizar a segunda instância de julgamento com funcionalidades já existentes no Carf, dando celeridade aos processos administrativos fiscais e diminuindo a quantidade de processos submetidos. Processos de baixa complexidade são aqueles que chegam até mil salários-mínimos, enquanto os de pequeno valor chegam a 60 salários-mínimos.

Tanto o contencioso de pequeno valor, quanto o de baixa complexidade serão julgados em primeira instância por decisão monocrática, com a possibilidade de o contribuinte recorrer às turmas recursais. Os entendimentos do Carf devem ser seguidos obrigatoriamente.

TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA
Acordos com contribuintes renderam R$ 14,1 bilhões para o Fisco em 2022

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional arrecadou R$ 39,1 bilhões Linscritos em dívida ativa em 2022, sendo que 36% do arrecadado (R$ 14,1 bilhões] é resultado de acordos de transação  tributária. A modalidade permite que Fisco e contribuinte façam acordo, com concessoes recíprocas, visando extinguir os débitos tributários.

Prevista há anos no Código Tributário, a transação foi regulamentada em lei em 2020. Ao longo dos últimos anos, o programa vem se consolidando como política pública, especialmente diante da crise intensificada pela pandemia. Do início para cá, já foram negociados mais de R$404,3 bilhões em dívidas.

De acordo com Gilberto Ayres Moreira, sócio do escritório Ayres Ribeiro Advogados, é perceptível o interesse da Procuradoria e da Receita Federal em resolver as questões tributárias com maior celeridade. O especialista em tributação e comércio internacional comemora o esforço dos órgãos em dialogar com os contribuintes. “A transação chega como uma solução para empresas em dificuldade económica. Quando entram em situação de insolvência, a primeira coisa que fazem é parar de pagar os tributos. Antes, para se reorganizarem e voltarem à conformidade tributária era muito diffcil. O custo fiscal é muito pesado. Oferecer a possibilidade de transacionar com o Estado e resolver a situação dessas empresas é uma oportunidade muito favorável”, comentou.

A PGFN destaca a importância da recuperação dos créditos públicos vencidos e não pagos espontaneamente para financiar a estrutura da administração pública e proteger os direitos. O relatório  de gestão 2022 considera que “da necessidade de custear as atiuidades de prestação de serviços públicos surge a obrigação jurídica do Estado em cobrar as receitas que foram previstas constitucionalmente como fonte de recursos para arcar com despesas públicas”.

A ideia aproxima o Brasil do cenário internacional que já usa atransação, como é o caso da Alemanha, França, Estados Unidos e Itália, ou autorizam a arbitragem de débitos tributários (Portugal e  itália). Atualmente dois programas de conformidade da Receita Federal ganham destaque: o Litígio Zero (focado na renegociação de dívidas por meio da transação tributária para débitos discutidos nas DRJ, Carf e pequeno valor) e o Confia (ainda em fase de desenvolvimento).

O tributarisía Bruno Fajersztajn, sócio do Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados, defende a necessidade de mudanças em lei para uniformizar o sistema de sanções e evitar a judicialização. “È preciso punir os sonegadorés e ninguém discorda disso, só não pode haver generalização como hoje. È preciso identifi car e separar o contribuinte de boa-fé-que pode adotar uma interpretação da lei mais agressiva ou nao-dosonegador, que falsifica documentos, que repete as infrações em diversas oportunidades. Os programas de conformidade são uma forma de identificar o contribuinte de boa-fé, que precisa ser tratado diferente”, afirmou durante congresso do 1BDT em São Paulo.

“E preciso que haja um equilíbrio entre o que o governo precisa e o que o empresário precisa. Temos um Estado social de direito, isso implica na necessidade e obrigação de implementar melhorias sociais, mas ao mesmo tempo dar condições para que isso possa ser também provido pela iniciativa privada”, pondera o tributarista Eduardo Natal, presidente do Comité de Transação Tributária da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (ABAT) e sócio do escritório Natal & Manssur.

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